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Bancos fecham quase 4 agências por dia; em cidades pequenas, nem Pix ajuda a compensar perdas
13/03/2022 / 08:30
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O avanço da digitalização bancária, na esteira da pandemia e do Pix, sistema de pagamentos criado pelo Banco Central, deu impulso ao movimento de fechamento de agências bancárias. Afinal, de acordo com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), atualmente apenas 3% das 100 bilhões de operações bancárias são realizadas em agências.

O problema é que muitas cidades que não têm mais a presença física das instituições financeiras não conseguem recuperar todo o dinamismo econômico com os sistemas de pagamento, transferência e saques digitais. Muitas sofrem ainda com baixa conexão à internet, o que dificulta o acesso aos meios digitais.

No ano passado, 1.017 agências bancárias fecharam as portas no Brasil, ou quase quatro (3,85) por dia. Damolândia, no interior de Goiás, é uma das 438 cidades que ficaram sem agência bancária desde 2016, segundo dados do BC. Forte em produção de leite, a cidade fica a 90 quilômetros de Goiânia e ainda se ressente de ter sumido do mapa bancário do país.

— Pessoal mais idoso já ia para a agência e recebia, subia a rua e ia pagando, comprando de novo. Hoje em dia o pessoal vai para Inhumas receber e em Inhumas já gasta também — diz Augusto, referindo-se à cidade a cerca de 30 quilômetros onde ainda há agência bancária.

Ele conta que o pior momento foi quando a agência fechou e a população não havia se adaptado a usar cartão de crédito ou débito. Na época, o Pix nem existia.

Com o passar do tempo, as maquininhas de cartão foram sendo adotadas pelos comércios e, com a chegada do Pix, as vendas ganharam impulso. Mas Augusto ressalta haver uma diferença entre as gerações:

— Muita gente tem cartão hoje ou às vezes paga no Pix, mas são pessoas mais novas. As mais de idade não têm costume de usar cartão. Pagar no Pix, nem se fala.

Abismo de gerações
O produtor rural Welson Gomes da Silveira, de 52 anos, era um dos correntistas da agência que fechou em Damolândia. Quando precisa ir ao banco em Inhumas, demora uma hora para ir e voltar, de moto. Apesar de ter no celular o aplicativo de outra instituição, o Sicoob, pede ajuda aos filhos quando precisa resolver algo pela internet. Para ele, tudo era mais fácil antes.

— Aqui a fila era bem menor, só quando era dia pagamento de prefeitura era mais complicado, mas aí você ligava para um amigo e perguntava se estava tranquilo lá no banco, ia lá e resolvia — diz Silveira, contando ter ficado duas horas na fila, para fazer depósito e pagamentos, na véspera.

Em Damolândia, há uma lotérica onde é possível fazer depósitos, pagamentos, saques e empréstimos, mas segundo a secretária de Finanças da cidade, Lucélia Joventina Alvarenga, o local não consegue atender toda a demanda da população. Mas ela ressalta que os bancos digitais vêm ganhando espaço entre os moradores, especialmente depois que uma operadora de internet móvel passou a funcionar na cidade.

O que é o Pix?
É um meio de pagamentos criado pelo Banco Central que permite fazer transferências e pagamentos instantâneos 24 horas por dia e sete dias por semana. A promessa é que o novo seviço seja mais simples que os atuais TED e DOC. O Pix começou a funcionar no dia 16 de novembro.

Como acesso o Pix?
O Pix estará disponível em qualquer plataforma que a instituição financeira escolher. No entanto, o BC espera que o celular seja o canal mais usado. Em um primeiro momento, será necessário ter acesso à internet, mas o BC prevê que um serviço off-line esteja disponível em 2021.

Quem poderá utilizar o Pix?
Qualquer pessoa ou empresa que tenha uma conta corrente, conta de depósito ou conta de pagamento pré-paga. Para transferências entre pessoas físicas e pagamento de pessoas físicas para empresas, o Pix será gratuito. Para MEIs, venda com finalidade comercial poderá ser tarifada.

O que é uma chave Pix?
A chave é um meio de identificar a conta do usuário. Há quatro tipos: CPF ou CNPJ, e-mail, número de celular e uma chave de segurança aleatória de números e letras. Na hora de fazer transferência, em vez de o usuário ter que informar nome, CPF, número da conta e da agência, como é feito atualmente, basta colocar a chave Pix.

Como cadastrar as chaves?
O registro será feito pelo site ou app da instituição onde o cliente tem conta. É preciso confirmar a posse da chave e vinculá-la à conta do Pix. Por exemplo, no caso do uso do e-mail ou do celular como chave, o usuário receberá um código por SMS ou por e-mail que deverá ser inserido no app para confirmar a identificação.

Quantas chaves Pix posso cadastrar?
Instituições financeiras poderão impor limites para cada transação com o Pix Foto: Arte O GloboFoto: Arte O Globo
Pessoas físicas podem ter cinco chaves para cada conta da qual sejam titulares. Para empresas, o limite é de 20 chaves por conta. O cadastramento de chave promete facilidade e rapidez no uso diário do Pix, mas não é obrigatório.

Como fazer uma transferência?
O Pix vai aparecer no aplicativo do banco ou da fintech, ao lado do TED e do DOC. Ao selecionar a opção, quem estiver usando o serviço poderá digitar uma identificação de quem vai receber o dinheiro, a chave Pix (CPF, e-mail ou telefone celular). Quem for enviar recursos, coloca o montante a ser transferido e aprova a transação. Quem recebe pode gerar um QR code e enviá-lo ao pagador.

Qual a diferença entre Pix, DOC e TED?
Nas transferências TED/DOC, o pagador precisa digitar os dados do recebedor, como seu banco, CPF/CNPJ, número da agência e tipo de conta. O serviço só está disponível em dias úteis e em determinados horários. Além disso, no caso do DOC, o valor só fica disponível horas depois ou no dia útil seguinte. No Pix, o pagador inclui a chave Pix no celular ou lê o QR Code do recebedor e ambos recebem uma notificação de operação concluída. O Pix é aceito em qualquer dia e horário.

Haverá limite de transação no Pix?
O BC não estabeleceu um limite para o Pix, mas as instituições financeiras poderão impor valores máximos para cada transação. Estes, porém, não poderão ser inferiores aos limites estabelecidos para outras opções de pagamento.

Quanto o Pix vai custar?
Não haverá cobrança para pessoas físicas no caso do recebimento e envio de recursos. Mas, caso recebam dinheiro ao fazer uma compra ou se usarem os canais de atendimento do banco, quando houver meios eletrônicos disponíveis, a instituição financeira poderá cobrar tarifa. MEIs e autônomos seguem as mesma regras. Se a conta Pix for usada apenas para fins comerciais, pode ser cobrada tarifa a partir da 31ª transação de recebimento. No caso de pessoas jurídicas, podem ser tarifados tanto o pagador como o recebedor.

Como fazer um pagamento via Pix?
Para fazer compras, o Pix também poderá ser usado via QR Code. O consumidor abre o aplicativo do banco ou da fintech, seleciona a opção Pix e direciona a câmera do celular para o QR Code disponibilizado pelo estabelecimento comercial, que também pode, assim como em transferências, informar sua chave Pix

O que é possível pagar com Pix?
É possível fazer compras e pagamento de prestadores de serviço que também tenham Pix. Pode-se usar o Pix para pagar contas de luz, taxas e multas a órgãos federais. O Tesouro Nacional ainda está desenhando o calendário para o pagamento de taxas como inscrições de vestibular e emissões de passaporte. Também está sendo desenvolvida uma ferramenta para facilitar a compra de imóveis e carros.

O Pix é seguro?
As informações pessoais são protegidas pelo sigilo bancário e as medidas de segurança já adotadas pelas instituições financeiras em TEDs e DOCs serão utilizadas no Pix. Em caso de erro em uma transação, valem as regras atuais. Se ocorrer o envio de um valor errado, será necessário negociar com o recebedor para que o montante seja devolvido.

Como é o Pix no mundo?
Tecnologias similares ao Pix estão disponíveis em 56 países. No México, por exemplo, ele também foi implementado por órgãos federais. Já nos EUA e na China, foram empresas privadas. A Austrália tem um modelo híbrido, público e privado. Reino Unido e Chile foram os primeiros a adotar a tecnologia. Em algumas metrópoles globais, a principal mudança causada pela expansão desse tipo de meio de pagamento foi a drástica redução na circulação de papel-moeda.

Qual o papel do Banco Central?
O Banco Central provê a infraestrutura do Pix, uma base de dados centralizada com os dados das contas dos recebedores. Dessa maneira, os participantes do sistema de pagamento podem aproveitar a infraestrutura única para acelerar o processo de transferência e pagamento

— Essa questão dos bancos digitais trouxe uma facilidade. O Pix é mais recente, mas os bancos digitais, cartão de débito, se popularizaram mais após a saída do banco. Antes a gente tinha o dinheiro, agora é o cartão — diz Lucélia.

O Pix Saque e o Pix Troco, que entraram em operação no fim de novembro, devem compensar, em parte, o fechamento das agências. As mais recentes funcionalidades do Pix permitem sacar dinheiro em lojas, padarias e supermercados, como em um caixa eletrônico.

— Você pode sacar dinheiro de qualquer lugar, não precisa ficar com tanto dinheiro na carteira e ainda ajuda o lojista, porque ele será compensado — afirmou o presidente do BC, Roberto Campos Neto.

Entre dezembro do ano passado e janeiro, o Pix Saque e o Pix Troco movimentaram R$ 10,23 milhões, em 71,8 mil transações. O maior uso é da modalidade saque: foram operações em 3.339 cidades, sendo 73% delas no interior do país.

O processo de fechamento de agências é apontado pelo mercado como necessário para a redução de custos, além da pressão por contas sem tarifa para competir com bancos digitais.

As fintechs, por sua vez, vêm registrando aumento de clientes no rastro do fechamento de agências pelos bancões tradicionais.

Para Felipe Félix, CEO do Will Bank, que tem 60% dos seus clientes no Nordeste, sendo 55% desse total em cidades com até 100 mil habitantes, o banco digital chega para atender não apenas locais sem agências, mas também para atuar na inclusão bancária.

— Precisamos criar uma estrutura que seja próxima do cliente, de como ele se relaciona com os produtos financeiros — diz Félix.

Para ele, a tendência é que, tendo condições de resolver seus problemas remotamente, o cliente não vai querer ir até uma agência.

A Zetta, associação criada por Nubank e Mercado Pago, afirma que a modernização da legislação, comandada pelo BC, deve ampliar a competição entre as instituições e a inclusão financeira no país.

“Acreditamos que a melhor estratégia para conquistar os clientes, em qualquer localidade, é continuar a prestar serviços simples, práticos, seguros e seguir inovando”, diz a associação.

Um estudo da Zetta constatou que 44% dos municípios do país não têm agências.

O BC e a Febraban argumentam que não há cidade no Brasil sem atendimento bancário, citando postos de atendimento, correspondentes bancários, caixas eletrônicos, lotéricas e aplicativos. O número de postos de atendimento e correspondentes bancários inclusive aumentou nos últimos anos, segundo dados do BC.

Prefeitura quer banco
Comerciantes e o prefeito de Damolândia, Rogério Labanca Neto, de 44 anos, contam que alguns moradores preferem ir a cidades vizinhas resolver problemas no banco e até sacar a aposentadoria. E acabam fazendo compras por lá. Isso, diz Labanca, tira o dinamismo da cidade de 2,9 mil habitantes, que perde renda, emprego e tributos.

Logo depois que a agência fechou, Meire Cristina Pereira Rosa, dona da Drogaria Cristina, viu uma oportunidade: oferecer serviços de correspondente bancário, como pagamento de contas, empréstimos e saques.

Ela deslocava um funcionário só para isso, e a ajuda de custo oferecida não cobria as despesas. Depois de três anos e uma tentativa frustrada de negociar com o banco responsável, ela desistiu.

Desde então, nos últimos dois anos, a prefeitura tem procurado instituições financeiras que se interessarem se instalar na cidade. O prefeito está otimista com as conversas atuais com o Sicoob e argumenta que a abertura de uma agência seria urgente:

— O maior desafio que temos na cidade é a geração de emprego, mas acho que é a questão da agência é fundamental, porque qual empresário vem para a cidade se não tem um banco?

Em nota, o superintendente de Coordenação Sistêmica do Sicoob, Vinícius Rezende, disse que a instituição está aberta a qualquer comunidade que busque maior inclusão financeira, especialmente em regiões não atendidas pela rede bancária tradicional.

Mas ainda há instituições financeiras que apostam na abertura de novos postos. Caso do Banco Daycoval, especializado em crédito para empresas e pessoas físicas, produtos de câmbio, gestão de recursos e investimentos. Este ano, o banco pretende ampliar em 10% o atendimento presencial.

Em 2021, o número de funcionários do Daycoval cresceu 16,5%. A diretora de RH do banco, Carla Zeitune, diz que houve alta de 9% dos postos de câmbio, 20% dos de consignados e 5% dos pontos de atendimento a empresas.

— O Daycoval é uma casa que sempre prestigiou o relacionamento, e isso acontece quando se faz negócios olho no olho. Estar na calçada pode fazer toda a diferença. A nossa estratégia é crescer e estar perto dos clientes, um pouco na contramão do setor — afirma Carla.

Outro caso é o da Caixa Econômica Federal, que em 2021 anunciou a abertura de 268 unidades, para estar presente em todos os municípios com mais de 40 mil habitantes. Mas críticos veem no movimento uma motivação política.

Informações: O Globo