Todo início de ano, algumas pessoas têm o hábito de fazer uma lista de metas a serem alcançadas ao longo dos próximos 12 meses. Em 2024, para Mariana Prestes, filha de um dos políticos mais conhecidos do Brasil no século XX, Luís Carlos Prestes, a meta é manter o diálogo aberto e uma vida atuante diante da série de ameaças ao cotidiano das pessoas mais simples.
“A partir do momento que as pessoas entenderem que tudo na nossa vida é política, ela vai começar a olhar para as questões básicas da vida dela, da cidade, da sociedade, que tudo vai depender disso. É preciso sair da tela do computador, do smartphone e ir no tête-à-tête mesmo”, defende Mariana, que leva uma vida simples em Baía Formosa, cidade do surf e santuário das tartarugas marinhas, que fica a cerca de 1h30 (97 quilômetros) de Natal.
Ela lembra que nesta quarta (3), seu pai, Luiz Carlos Prestes completaria 126 anos se estivesse vivo. O Cavaleiro da Esperança, como também ficou conhecido, deixou sua marca na história ao liderar um movimento que percorreu 25 mil quilômetros Brasil afora. Passando, inclusive, pelo Rio Grande do Norte. De sua casa, Mariana conversou por telefone com a Agência Saiba Mais e contou como tem observado o cenário político atual e a constante ameaça que, apesar de vencida nas eleições de 2023, permanece atuando não apenas no Brasil e América Latina, vide a Argentina, como no mundo.
“Sempre acredito que temos que ter esperança, principalmente, depois de quatro anos difíceis para a população brasileira, tanto com o governo do inominável, passando pela pandemia da Covid-19, quando perdemos mais de 700 mil pessoas. Ter um ano de 2023 com grandes avanços, acredito que a esperança de todos refloresceu, ressurgiu, com isso temos mais possibilidades de caminhar para um futuro bem mais pleno para todos”, comenta Mariana.
Apesar da rotina desgastante e do cansaço do trabalhador brasileiro, a filha de Prestes lembra que cada benefício do qual se usufrui atualmente, como um posto de saúde funcionando, por exemplo, é resultado de uma luta que precisa permanecer.
“Os 60 milhões que votaram no Lula têm uma grande participação para que o governo dê certo. Depende de cada um de nós, que elegemos esse terceiro mandato do Lula, fazer sua parte. Precisamos estar na rua, conversando com os vizinhos, com a população em geral… que é uma coisa que está muito deficitária, precisamos resgatar a condição de conversar com as pessoas. Não é de fazer convencimento, não temos que convencer ninguém, as pessoas precisam ter consciência do que foram esses quatro anos que passaram e, agora, com esse um ano de governo de Lula, como as coisas mudaram para melhor. Então, esses 60 milhões de pessoas que acreditaram no 3º mandato do Lula têm que estar juntas, participando, senão, o governo sozinho, por mais que se esforce, não vai conseguir fazer grandes coisas”, avalia.
Mas, como manter o diálogo na era do isolamento e das relações virtuais?
“É muito fácil ficar atrás da tela e digitar, o corpo a corpo é diferente. Se os ministros não saírem dos gabinetes, se o Lula não sair do Palácio do Planalto, se a militância não sair para rua, eles voltam. Eles estão se organizando, firmes e fortes, o neofascismo está aí, batendo na nossa porta, veja o que aconteceu na Argentina. Se não tivermos a capacidade de estar junto, de sair do aconchego e ir para a rua batalhar, vamos perder. Não é só na América Latina, está no mundo inteiro a ascensão do neofascismo, se as pessoas não tiverem essa noção do perigo que é, estamos fadados a uma perda grandiosa”, alerta Mariana Prestes.
A disputa política à qual a filha de Prestes se refere, não perdeu força e segue por caminhos imprevisíveis. Depois de Bolsonaro (2019-2022) no Brasil, mais recentemente, Javier Milei foi eleito na Argentina (2023) como o mais recente representante da nova safra de extrema direita. Além disso, Donald Trump (2017-2021) volta a ser uma ameaça nos Estados Unidos.
“O brasileiro ainda está distante de participar da política, justamente, porque não entende que tudo que a gente faz é política. Isso vai depender, também, de levarmos essa informação para as pessoas. Elas não sabem que se temos um posto de saúde, foi através de políticas públicas, se conseguiu construir, contratar médicos, ter vacina… não é graças a ninguém, a gente batalhou, a gente foi atrás e tem hoje um governo estruturado que entende que é obrigação fornecer essas coisas. As pessoas precisam ter consciência do que se passa e tudo que se passa é política. Não adianta chegar com arrogância ou forçar uma conversa, tem que deixar a coisa fluir naturalmente”, encoraja.
Mariana tem título de eleitor em Baía Formosa e enxerga no cenário local a reprodução do que já vem ocorrendo no restante do Brasil.
“Apesar do Lula e dos deputados federais terem sido muito bem votados aqui, a questão do inominável [Bolsonaro]… não gosto nem de falar o nome dele, ainda é forte. Temos que estar sempre rebatendo as fake News [notícias falsas]”, critica Mariana.
Além do aniversário do pai, 2024 também marca o centenário da Coluna Prestes, o que deve motivar ainda mais mobilizações.
“Vamos levar informação e fazer um resgate histórico da Coluna, sobre a vida do Cavaleiro da Esperança, será um ano bem interessante”, adianta.
Coluna Prestes
O movimento que resultou na Coluna Prestes, que foi de 1925 a 1927, começou com o Tenentismo, quando militares de baixa patente (os tenentes), demonstraram estar insatisfeitos com o governo da 1ª República, marcado pelo revezamento na presidência da República das oligarquias de São Paulo e Minas Gerais, a política do café-com-leite.
A questão se tornou pública durante as eleições de 1922. Enquanto SP e MG lançaram Artur Bernardes, as oligarquias do Rio Grande do Sul, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro lançaram Nilo Peçanha como candidato.
Durante a disputa, Artur Bernardes utilizou falsas cartas atribuídas a militares com críticas a ele. A tensão piorou quando Artur Bernardes, depois de eleito, mandou prendeu o marechal Hermes da Fonseca, por críticas ao governo.
Houve várias revoltas, uma das mais conhecidas é a do Forte de Copacabana, e foi quando tenentes rebelados de São Paulo e do Rio Grande do Sul que surgiu a Coluna Prestes.
A historiadora, antropóloga e professora da Universidade de São Paulo (Usp), Lilia Schwarcz, aponta que os integrantes da Coluna Prestes pediam a implantação do sistema de voto secreto, a reforma do ensino, a obrigatoriedade do ensino primário, além da moralização da política. Eles também denunciavam as condições de vida miseráveis da população e a exploração dos mais pobres.
No Rio Grande do Norte, a Coluna Prestes passou pela cidade de São Miguel, causando alvoroço em Mossoró devido a notícias de que os tenentes também invadiriam a cidade. Depois o grupo adentrou Luís Gomes e rumou para a Paraíba.
Portal Saiba Mais