SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A fadiga do home office promete durar mais tempo do que o imaginado. Com a escalada da pandemia e a vacinação lenta, a data para o retorno aos escritórios fica cada vez mais indefinida, e gestores de recursos humanos de grandes empresas mantém a postura de voltar apenas quando o cenário estiver mais confortável.
Segundo uma pesquisa realizada pela Dimep, empresa de produtos para controle de acesso e registro de ponto, o cenário pós-pandemia mostra que ainda há pouco planejamento de retorno e indica para um modelo híbrido de trabalho. Em um levantamento com 104 empresas de diferentes segmentos e portes que adotaram o teletrabalho, 36,5% ainda não traçaram uma estratégia, 33,7% afirmam que voltarão à rotina normal, mas sem data estabelecida, e 18,3% irão seguir com o trabalho remoto.
A pesquisa também avaliou que apenas 6,7% das companhias contavam com um programa de home office, e a porcentagem deve chegar a 22% em um cenário pós-pandemia.
Dentre os principais problemas encontrados para a adaptação ao home office, 30,8% responderam que a gestão das horas trabalhadas foi o maior desafio, 25% se queixaram da falta de uma estrutura adequada para a realização do trabalho e 19,2% reclamaram da comunicação entre as equipes.
Shirlei Lima, gerente de produtos da Dimep, afirma que os problemas apontados, tirando a questão da infraestrutura, são reflexos de um modelo baseado em horas trabalhadas, e não em entrega. Isso fez com que nos últimos meses empresas estabelecessem melhor a comunicação entre empregadores e funcionários, diz a pesquisadora.
“Empresas que estão trabalhando olhando para o resultado, que conseguem estabelecer engajamento com os funcionários e prezam pela comunicação, vão se sentir mais seguras para o retorno”, diz. A pesquisadora também afirma que quem tinha um olho na tecnologia e o home office no radar teve facilidade para se adaptar e também tem chances de ter um bom retorno no pós-pandemia.
Ainda é difícil estimar uma data definitiva para o retorno, e tudo depende do ritimo da pandemia. As empresas procuradas pela reportagem afirmam que incentivam a vacinação e criaram conteúdos sobre o tema, mas fica a encargo do funcionário se vacinar ou não.
A GSK Consumer Healthcare, reabriu o escritório em março deste ano, e cada funcionário determinou em qual momento se sente à vontade para o retorno. Os que usam transporte público não estão autorizados, e é necessário fazer um agendamento para usasr o espaço.
O local permite apenas 60% de ocupação, que é agendada com o gestor de cada áerea, diz Andressa Tomasulo, gerente sênior de RH da GSK Consumer Healthcare.
“Entendemos que a vacinação é muito importante para retornar com mais segurança, e é uma ação individual, fica a escolha do funcionário”, afirma.
A FICO, empresa de software de análise preditiva, já tinha uma política de flexibilidade de trabalho antes da pandemia, e já conversa sobre o retorno ao escritório, diz Kayla Vallim, diretora sênior de operações. A empresa não tem data definida, mas sabe o que fazer quando acabar o isolamento social.
“Fizemos uma pesquisa global, e os colaboradores optaram por trabalhar até três dias ou mais nos escritórios”, diz a diretora. “Vimos que trabalhar a comunicação e a empatia foi essencial para o período, entendemos os problemas e as demandas dos funcionários, e voltaremos apenas quando for um ambiente seguro para todos”.
A DSM, empresa holandesa que atua com ciência para nutrição e saúde, tem metas bem definidas para o retorno, mas também não sabe quando vai acontecer. “Uma das premissas que sempre tivemos é que só vamos retornar com a certeza de mínima segurança dos colaboradores”, diz Renata Medeiros, diretora de recursos humanos.
Para as áreas administrativas o trabalho será 60% presencial e 40% remoto. De 2.200 funcionários da América Latina, 45% vão trabalhar no esquema híbrido. Os dias de trabalho remoto e presencial serão definidos com os chefes de cada equipe. Às sextas, será implementado o “short friday”, quando o time administrativo será liberado às 14h.
A Camargo Corrêa Infra, empresa do setor de construção, foi uma das empresas que foi pega de surpresa e teve que correr para se adaptar ao novo modelo de gestão. Ao longo dos meses, perceberam que a rotina de trabalho mudou bruscamente, e resolveram focar na entrega, olhando menos para a jornada de trabalho, diz Francisco Fay, diretor de pessoas da empresa.
Está nos planos um novo escritório para o fim do ano, com uma cara diferente do modelo pré-pandemia. “Será um espaço voltado para reunião e para trabalhos colaborativos, enquanto o funcionário poderá cumprir tarefas de rotina em casa”, diz. A ideia é que a ida ao escritório seja feita até três dias por semana.
Oliver Kamakura, sócio de consultoria em gestão de pessoas da EY Brasil, lembra que o modelo híbrido não é paliativo, é uma forma de planejar a força de trabalho. “A discussão não é substituir um ao outro, é ajustar modelos”, diz.
Por mais que pareça uma ótima solução para a nova realidade, o modelo pode gerar ruídos para os dois lados, tanto para trabalhadores quanto para a chefia. “Será que trabalhando de outro lugar que não seja o escritório serei avaliado da mesma forma? Como avalio meu funcionário agora? São questionamentos que podem aparecer pela frente”, diz Kamakura.
Junto a flexibilidade do trabalho, também surgirão formas alternativas de contratação. “Terá mais trabalhos temporários, com pessoas contratadas para um projeto específico, independentemente do local que esteja”, afirma Kamakura. As empresas também deverão olhar para a revisão de benefícios, já que estão ancoradas no deslocamento físico. “Os próximos passos terão que ser articulados com clareza, sem comunicação vai dificultar ainda mais a retomada”, diz.