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A Importância da educação financeira nas escolas públicas de João Pessoa
18/12/2023 / 17:40
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Vivemos num país onde ponderar escolhas e conversar de forma adequada sobre dinheiro é incomum para a maioria das pessoas, o que resulta em sérios problemas sociais. Embora na rede pública de ensino não exista uma disciplina específica voltada para a educação financeira, em 2020 o assunto foi incluído na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), como um tema transversal e uma abordagem interdisciplinar, dialogando com outras áreas do conhecimento.

Sem um ensino de qualidade, a sociedade tende a repetir padrões negativos de comportamento, prejudicando sua vida econômica, das gerações futuras e, consequentemente, a economia do país.

A Escola Municipal Américo Falcão, localizada no bairro Cristo Redentor, em João Pessoa, possui 521 alunos matriculados em 2023 e comporta turmas da educação infantil ao 5° ano. Uma pesquisa realizada na instituição, com alguns alunos, pais, professoras e gestora pedagógica, aponta benefícios e desafios no ensino.

Alessandra Ramos é mãe do Alex (8), e relata que adquirir conhecimento financeiro desde cedo teria facilitado a vida adulta, e que embora converse com o filho sobre o tema em casa, é importante as escolas abordarem o assunto.

Alex está no 2º ano e mostra que mesmo pequeno já tem uma noção do que a educação financeira engloba, além de estar aprendendo a usar com moderação, o dinheiro que ganha.

Professora do 2°ano, Wilderlane de Oliveira diz que seus alunos são curiosos, abertos a novidades e adoram quando o tema é sistema monetário. A professora explica que o segundo ano está mais voltado para a literacia e materacia, no entanto, as crianças têm contato com o tema financeiro. Diz ainda que a temática seria interessante na formação continuada dos professores, para uma melhor abordagem em sala.

INCENTIVO

Carol Paiffer, CEO e co-fundadora da ATOM (maior mesa de traders da América Latina) é uma das mulheres mais influentes do mercado de investimento do Brasil. Carol idealizou o projeto ”Teo Tourinho”, série exclusiva de animação voltada especialmente para as crianças, com intuito de ensiná-las a construir uma relação saudável com o dinheiro. Um dos objetivos de Carol é que esse projeto chegue nas escolas e alcance ainda mais crianças. O conteúdo é gratuito, composto de vídeos divertidos que beneficiam não só os pequenos, mas também os pais. A investidora também acredita que a educação financeira é responsabilidade não só das escolas, mas das famílias.

‘’O grande desafio nas escolas, eu acho que são dois. 1: Deixar isso interessante pra criança, porque a criança precisa também gostar daquilo. 2: Incluir os pais, porque eu acredito muito nisso, que a educação não é só responsabilidade da escola. A educação também é responsabilidade das famílias, e quando a gente sobre dinheiro, não é só técnicas. São crenças, então isso está enraizado na nossa cultura.’’

 

Pôr em prática a economia dentro de casa nem sempre é fácil, especialmente para quem não tem o mínimo de conhecimento e/ou vive em situação de vulnerabilidade financeira, o que é a realidade de boa parte das famílias. Segundo o Portal da Transparência do Governo Federal, de janeiro de 2023 a outubro do mesmo ano, 81.079 pessoas foram beneficiadas por programas sociais, em João Pessoa.

Já o levantamento mensal da Serasa aponta que em outubro de 2023, 43,94% da população adulta no Brasil estava inadimplente. Na Paraíba o percentual foi de 38,38% da população.

ECONOMISTA

O economista Gustavo Cerbasi diz que a educação financeira é entendida na escola, mas que para que a educação seja absorvida na vida do jovem, é preciso praticá-la, e esse debate também precisa acontecer em casa. Também fala sobre a importância da escola ensinar e provocar o debate no lar.

”Eu iria dizer que os pais deveriam provocar o assunto entre os filhos, mas repito, os pais não tiveram educação financeira na sua infância. Então talvez as escolas possam provocar atividades nem sempre tão confortáveis entre os pais, de reflexões, debates, exercícios, atividades que façam com que os pais também repensem suas escolhas e ponderem junto com os filhos, a qualidade do que consomem. O papel da escola nesse momento, não é só de ensinar, mas de provocar pais a terem debate com seus filhos, não para os filhos apenas aprendam, mas para que os pais também aprendam e criem uma cultura de conversar sobre dinheiro, ponderar suas escolhas, avaliar se suas escolhas foram as melhores e ter um efeito de aprendizagem para que também aprendam e tenham uma cultura de conversar sobre dinheiro, ponderar escolhas… então o papel da escola nesse momento é o de combinar a educação com provocação pra dentro do lar.”

Fábio Braga, pai de Melissa (10) é representante de vendas e diz que além dele e a esposa acharem benéfico a escola instigar a área financeira da filha, são receptivos para ajudar com as tarefas escolares.

”A gente fica bem confortável, né. Porque assim, é muito importante os pais estarem presentes na educação formal/convencional. Quando abraça esse lado financeiro, você fica feliz porque isso aí é o futuro. Vai ver que ela vai ser uma pessoa mais organizada, ter perspectivas maiores de crescimento e também vai educar melhor os filhos dela.”

Melissa, que está no 4° ano, mostra que segue a dica de poupar parte dos recursos financeiros e usa o que pode com sabedoria, além de gostar de aprender na escola.

Hozana Ferreira é mãe de Caroline (11), trabalha como atendente de lanchonete e relata que foi prejudicada pelo desconhecimento na área, e que embora tente orientar a filha, sentiria dificuldade em auxiliá-la com as tarefas escolares voltadas para finanças.

”O conhecimento é libertador, né? E eu não dava tanta importância a isso quando eu era jovem, de trabalhar, guardar o dinheiro e pensar no futuro. Isso afetou bastante a minha vida e ainda afeta porque eu ainda tenho dificuldade de organizar minha vida financeira até hoje. E pra mim, se isso tivesse sido ensinado no passado, nas escolas com mais frequência, hoje era muito importante.”

Karoliny Ferreira (11) também está no 4° ano e entende que educação financeira é ”a forma de você economizar dinheiro e saber como gastar.” Ainda narrou como costuma usar o dinheiro que ganha.

”Eu não recebo mesada, mas de vez em quando recebo algum dinheiro. Às vezes eu vou na barraca e compro doce, mas na maioria das vezes eu gasto no mercadinho comprando lanche e de vez em quando sobra dinheiro.”

BNCC

De acordo com a estrutura da BNCC: ”Ao longo da Educação Básica – na Educação Infantil, no Ensino Fundamental e no Ensino Médio –, os alunos devem desenvolver as dez competências gerais da Educação Básica, que pretendem assegurar, como resultado do seu processo de aprendizagem e desenvolvimento, uma formação humana integral que vise à construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva.” Contudo, será que os docentes realmente estão aptos a repassar o conhecimento adequado para os alunos?

DESAFIOS

Cláudia Basílio é professora do 4° ano, e não apenas trabalha estratégias com a turma, mas também valores como inclusão, empatia e respeito. ”O meu lema da vida é não competição, e sim, colaboração, e eles já sabem disso.” A professora que ama lecionar, contou como aborda a educação financeira em sala e pontuou uma falha no sistema educacional: capacitação acerca do tema, que os docentes não receberam.

Rosane Paiva, gestora pedagógica da escola, conta que ela e toda a equipe sentem-se motivados por verem a necessidade de a educação financeira ser abordada em sala, mas que o assunto é muito novo para os docentes, alunos e pais. Esperançosa e preocupada, a gestora destaca que os principais desafios a serem enfrentados são formações exclusivamente voltadas ao tema para os professores, somadas ao material didático necessário.

”Quando a gente fala que a BNCC junto com o conselho nacional propõe essa abordagem nas disciplinas escolares, mas propõe de que forma? A gente tem que refletir sobre isso. Como, se os professores não estão preparados, como é que a gente vai debater esse tema? Então precisa de uma campanha nacional, estadual, municipal pra chegar até aqui nas escolas. Então é um trabalho longo, viu, mas a gente consegue.” Afirma.

Wleica Honorato é gerente da Primeira Regional de ensino, em João Pessoa, e responde por 167 escolas da Paraíba, sendo 117 na capital. Wleica diz que a implementação da educação financeira no catálogo de disciplinas precisa partir da BNCC, mas que por enquanto o tema é trabalhado como parte diversificada. Diz ainda que as escolas da rede estadual têm parcerias e incentivo educacional, como por exemplo, o ”redação nota 1000”. Também relata sobre os principais desafios a serem enfrentados.

”Quando você não tem ela pré determinada no catálogo da BNCC, já é um desafio porque ficará na vontade do bom gestor. Se for um mau gestor ele não se preocupará em fazer isso. Se o gestor realmente for bom, vai se preocupar em transformar os alunos em bons cidadãos. Houve época onde a educação era só conteudista, mas hoje precisamos trabalhar o ser humano como um todo e esse todo não está só em aprender ler e escrever.”