Não é exagero dizer que quase todo mundo tem WhatsApp – segundo pesquisa da Mobile Time/Opinion Box, de 2021, 99% dos smartphones brasileiros tem o aplicativo de mensagens instalado. Portanto, é inegável que o WhatsApp é uma forma poderosa de comunicação com o cidadão. Este artigo discute como governos podem fazer uso do WhatsApp na comunicação e na construção de relacionamentos com a população.
A maioria dos governos negligencia o ZAP. Muitos até já disponibilizaram um número para o cidadão interagir. Mas geram conteúdo específico para este canal? Produzem e distribuem conteúdos de maneira planejada, segmentada, micro segmentada ou personalizada? Tem orçamento e equipe especializada e dedicada ao ZAP? Estudam a jornada do cidadão e conhecem as personas com quem estão interagindo? Fazem gestão de relacionamento com os cidadãos, utilizando ferramentas de CRM adequadas? Fazem a gestão de grupos e comunidades de maneira planejada? Têm métricas para avaliar performance?
A prática demostra que apenas uma pequena parte dos governos entendeu a dimensão estratégica do WhatsApp e, na verdade, o tratam como apenas como mais um canal de atendimento passivo. Não perceberam que as tecnologias digitais mudaram a maneira como governos se conectam com os cidadãos-eleitores e lhes entregam valor. Já está passando a hora de acordarem!
Em primeiro lugar, é preciso alertar que, para se fazer uso do WhatsApp na comunicação com o cidadão, os governos precisam respeitar a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). Não se pode de forma invasiva colocar pessoas em grupos ou comunidades e nem mesmo mandar mensagens para elas sem que antes haja o Consentimento Ativo. É preciso, antes de qualquer interação, que seja enviado um convite para a pessoa, explicando a finalidade daquela comunicação e como os seus dados serão guardados, preservados e gerenciados.Somente após este consentimento ativo a comunicação poderá ser efetivada. E é necessário disponibilizar a opção de saída para quando a pessoa não mais quiser interagir.
Em segundo lugar, o WhatsApp deve ser tratado como uma mídia. Assim como os governos hoje já têm equipes especializadas e dedicadas às Redes Sociais, precisam também ter para o WhatsApp. Uma verba deve ser separada para ser investida neste canal. O conteúdo para o WhatsApp deve ser pensado, planejado e feito especificamente para ele. E precisa ser relevante, curto e adaptado ao perfil de cada audiência. Não é simplesmente colocar o que é produzido para a TV, para o rádio ou para redes como Facebook ou Instagram e disponibilizar no ZAP, como a grande maioria faz hoje. E disparar tudo indiscriminadamente para todos, em grupos e listas de transmissão. O que se consegue com isso é o owerpostinge o consequente o afastamento do cidadão.
Interessante mesmo é utilizar o WhatsApp integrado com as outras mídias. Em crossmídia com o site do governo(colocar um botão que o conecta direto com o ZAP), as redes sociais (utilizá-las, por exemplo para fazer SAC, atuar nos links da bio, etc.), fazer campanhas na TV, no rádio ou mídia impressa para gerar fluxo no WhatsApp. Dizer na propaganda da TV que é possível obter mais informação no canal de ZAP. E de preferência, que tudo seja organizado através de uma ferramenta omnichannelpara que todos os contatos do cidadão com o governo sejam gerenciados em um só lugar.
Em terceiro lugar, o ZAP deve ser visto como um canal de distribuição de conteúdo. Mas antes deve ser feito um estudo dos públicos, segmentos, micro segmentos, perfis, personas, grupos e comunidades e, ser bem compreendida a jornada dos usuários para que o aplicativo possa ser utilizado como um meio de comunicação efetivo, segmentado ou até mesmo personalizado.
Em quarto lugar, O WhatsApp deve ser pensado como um canal de conversa com o cidadão. Devem ser bem estruturadas e planejadas as divisões por grupos ecomunidades e feita a separação por editorais, temas e interesses. Estes grupos e comunidades podem ser utilizados como uma forma de escuta social (social listening) e para isto já existem ferramentas apropriadas de monitoramento. Da mesma forma que eles também podem ser utilizados para conversação com os diversos públicos. Para tanto é necessário qualificar os administradores-moderadores que vão interagir nos grupos e comunidades para pautar, fazer a interlocução e debater os temas de maior interesse tanto da população como do governo.
Desde janeiro de 2023, o recurso das “Comunidades do WhatsApp” está sendo liberado para uso no Brasil. Trata-se de um novo jeito de organizar grupos com temas relacionados e de aumentar a comunicação entre pessoas próximas. O recurso Comunidades tem o objetivo de reunir, em um único canal, subgrupos que possuam temáticas similares. Funciona como um “guarda-chuva” principal de diversos sub-temas, em que o administrador pode enviar avisos para todas as pessoas de uma só vez. A função permite unir até 50 grupos e tem, no total, limite para até 5 mil pessoas. Contudo a grande vantagem é a possibilidade de se utilizar a própria população para distribuir ou viralizar conteúdos do governo de forma orgânica. É claro que existem riscos – eventualmente pode ser também usado para espalhar fake news ou notícias negativas.
Em quinto lugar, o WhatsApp deve ser pensado como uma ferramenta de relacionamento com o cidadão. Assim como as demais redes sociais, o ZAP é uma mídia dialogal, ou seja, a comunicação é de mãos dupla. Precisa haver interação entre emissor e receptor. Não há nada pior do que se abrir um canal de relacionamento, o cidadão iniciar uma conversa ou fazer um pedido e não obter nenhuma resposta, ficar no vácuo.
Para funcionar, o WhatsApp precisa ser estruturado como um CRM (Customer Relationship Management). É fundamental montar uma operação com pessoas treinadas e capacitadas, com suporte de um software de CRM específico para o ZAP, que consiga assimilar atendimento(SAC, que pode ou não ser integrado a um chatbot), categorização e gestão de contatos e respostas/feedbacks e que esteja conectada com as áreas do governo que têm condições de responder ao cidadão nas suas demandas. O atendimento via ZAP pode ser muito mais ágil, eficiente e ainda tem o potencial de desobstruir canais de atendimento presenciais, muitas vezes abarrotados.
Finalmente, é sempre bom lembrar as palavras de Peter Drucker, “quem não mede, não gerencia”. É necessário que sejam estabelecidos KPIs (Key Performance Indicators), que são os Indicadores-Chave de Desempenho, para avaliar se os processos estão funcionando adequadamente e se objetivos e metas estão sendo atingidos.
O WhatsApp é uma grande arma que governos podem usar para se comunicar, distribuir conteúdo, escutar,conversar com diversos públicos e construir relacionamentos. E, assim, melhorar a transparência, facilitar a prestação de contas e incentivar a participação popular. Claro que muito ainda precisa ser aprimorado para que os governos consigam fazer a tão necessária transformação digital, contudo, as novas ferramentas de Inteligência Artificial (IA) que estão sendo gradativamente disponibilizadas podem ser fortes aliadas neste processo de gestão da comunicação. Bora zapear?
RODRIGO MENDES é estrategista de marketing político e comunicação pública e institucional com 25 anos de experiência. Coordenou 60 campanhas eleitorais e prestou consultoria para diversos governos, instituições, lideranças e empresas. É publicitário, sociólogo, especialista em marketing e mestre em Ciência Política.
Autor de “Marketing Político – o poder da estratégia nas campanhas eleitorais”; “Marketing Eleitoral – Aprendendo com campanhas municipais vitoriosas” e dos e-books “A falha na distribuição da comunicação”; “O eleitor subconectadoe a realidade do marketing eleitoral no Brasil”; “Marketing Governamental”; “Novas estratégias eleitorais para um novo ambiente político” e “DataMídiaPerformance”.