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Eleições: o que a experiência nos ensina
29/06/2023 / 15:12
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Na profissão desde 1989 com a política e no jornalismo desde 1986, é inevitável que a gente acumule muitas histórias e vivências em eleições. Tanto “cases”, quanto “causos”.

Quero compartilhar duas situações que vivi e as lições que podemos tirar. Elas mostram a importância de prestar muita atenção em tudo que se faz, para não dar mole ao adversário e, também, para flagrar os deslizes dos oponentes.

Além disso, outro ponto que quero ilustrar é a necessidade de ter um olhar crítico na hora de ler pesquisas qualitativas, para identificar oportunidades. Essas histórias podem ajudar e servir de inspiração para quem trabalha com marketing político e eleitoral.

Uberlândia, Eleições 1996: A estrada

Este causo ocorreu em Uberlândia, na campanha para prefeito de 1996. Na disputa, como principais candidatos, os dois grandes ícones da política local: Virgílio Galassi e Zaire Resende.

Do ponto de vista financeiro e de estrutura (equipe e equipamentos) era Davi (Zaire) contra Golias (Virgílio). Eu era um dos coordenadores da campanha do Zaire naquelas eleições. Nos reunimos no QG para assistir ao primeiro programa eleitoral. A princípio, sabíamos que, tecnicamente, seríamos inferiores, mas não que o baque seria tão grande.

Maluf havia comprado os direitos de “Caminhando”, música do Geraldo Vandré. Era a direita se apropriando de um hino das esquerdas no Brasil. E a equipe de Virgílio Galassi colocou, em uma estrada asfaltada, algo perto de 200 figurantes. Com a música do Vandré de fundo, o vídeo mostrava a estrada em uma lombada, as cabecinhas foram aparecendo e daqui a pouco, em câmera lenta, surgiu aquela multidão, com o candidato à frente, de mãos dadas com duas crianças, uma branca e uma negra, seguido daquele mundo de gente. Conforme a música e a caminhada evoluíam, a imagem ia fechando, até mostrar o Virgílio e as crianças bem de perto.

Foram buscar lã e saíram tosquiados

Depois que os programas terminaram, nós da coordenação com aquela cara de “levamos um banho”. Aí o Zaire, sempre com seu jeito tranquilo, sereno, olhou pra gente e disse: “Eu que fiz esta estrada”.

Dali, rindo de fazer inveja, fomos produzir o roteiro e de manhãzinha estávamos na mesma estrada, no mesmo local. Produzimos e colocamos um comercial no ar de forma urgente e também inserimos no material do próximo programa, com a seguinte mensagem:

“Sabe aquela estrada linda que o Virgílio mostrou no programa dele de ontem? Quem fez foi o Zaire”.

E entra a vinheta com o slogan fechando: “Zaire, pra crescer e ser feliz”. Era uma chapa com PMDB/PT, e o PMDB sempre foi desenvolvimentista e o PT sempre foi social. Daí o slogan. O “Z”, de Zaire, entrava como um chicote na tela, como se fosse o Zorro desenhando na tela com a espada a sua marca.

Resultado, a equipe de Galassi teve que tirar com urgência o material deles do ar.

Em suma: um detalhe, muitas vezes, é essencial em uma campanha política.

Paracatu, Eleições 2012: De 2% a prefeito eleito

Em 2012, saindo de BH para Verdelândia, no Norte de Minas, o amigo Carlos Dornas, do Instituto de Pesquisa Dornas&Dornas, de Sete Lagoas/MG, liga e diz: “Dá pra parar aqui no Beira Rio pra fazer a leitura de uma pesquisa?”. Respondi: “Chego em meia hora aí.” Era início de junho, final de tarde, e ele tinha uma pesquisa feita em Paracatu/MG.

Comecei a leitura. Dois candidatos se destacavam. Um ex-prefeito e então deputado em mandato, disparado na frente, com 38% na estimulada. O outro era o candidato do então prefeito, já reeleito e que não poderia disputar, beirava os 20%. Os outros dois eram um médico e um empresário do agronegócio.

Ao ler a pesquisa, em especial as questões ligadas ao nível de conhecimento e à imagem que a população tinha dos candidatos, somado às questões sobre a cidade e à rejeição dos nomes apresentados, fui taxativo:

Os dois primeiros vão despencar e os dois últimos têm uma chance grande de vencer. Tudo depende do trabalho que for realizado para um ou para outro”.

Dornas ligou para o 4º colocado, Olavo Condé (PSDB), que tinha apenas 2% na estimulada e nem aparecia na espontânea, mas que era desconhecido por mais de 85% dos eleitores e com uma rejeição de apenas 1% – fruto de ser desconhecido, por certo – e disse:

“Tô com um estrategista em marketing político aqui que tá dizendo que você tem chance de vencer. Podemos ir aí apresentar a pesquisa?”

Leitura da pesquisa indicou virada

E fomos. Chegamos perto das 11 da noite e havia um grupo na sala da empresa do candidato. Perguntei: “Todos aqui podem ter acesso a estas informações?”. E o dono da boiada – melhor, da soja – falou pra seguir em frente. E assim foi.

Então, apresentei meus argumentos:

  1. O ex-prefeito, do PT, está em primeiro lugar, mas com altíssima rejeição. Já bateu no teto e dali é só cair, ainda mais que é deputado estadual e, se sair do cargo, Paracatu ficará sem representação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
  2. O candidato indicado pelo atual prefeito está em segundo lugar e não tem força suficiente pra crescer. Ao mesmo tempo, pelo perfil do atual prefeito, da linha político eucalipto” – não deixa nada crescer em volta –, estava claro que ele escolheu alguém pra perder.
  3. O médico Doutor Bebeto e ele, Olavo Condé, apesar de estarem em terceiro e quarto lugar, são desconhecidos, têm baixa rejeição e são perfeitos para estabelecer uma estratégia do zero, sem vícios.

E fechei: “Um de vocês dois vence as eleições”.

Campanha direcionada, caminho da vitória

Dali, em seguida, fomos pra sala de Olavo e fechamos equipe e valores, só eu e ele, como deve ser.

Conforme a leitura que havia sido feita da pesquisa, não deu outra: Olavo Condé foi eleito com 43,38% dos votos e Doutor Bebeto ficou em segundo lugar com 28,48%. O candidato do prefeito ficou em terceiro lugar (18,22%) e o ex-prefeito e então deputado estadual, em quarto (9,92%).

Nas Eleições 2016, repetimos a dose e, como resultado, Olavo Condé foi reeleito com 54,32% dos votos válidos.

O que a gente aprende com essa história, em síntese: nada como uma boa leitura, de uma pesquisa bem feita.

 

João Henrique Faria é jornalista, estrategista político, professor da pós-graduação em Comunicação Pública e Governamental da PUC-MG, proprietário da Fator Consultoria e membro fundador do Coletivo Alcateia Política