Fazer uma boa campanha eleitoral, construir uma boa estratégia para o candidato é, inicialmente, um exercício de interpretação da realidade. Entender quais são, naquele momento, naquela conjuntura específica, as emoções predominantes e os desejos e aspirações que mais inquietam a maioria dos eleitores.
Maquiavel inaugura a ciência política em O Príncipe quando afirma que cabe ao conselheiro dos poderosos, “ver a realidade como ela é, não como gostaríamos que fosse”, ver “a verdade efetiva das coisas”. A proposta de Maquiavel do realismo político é, sobretudo, a afirmação de um método de trabalho. No que consistiria esse método? Em uma campanha eleitoral, na construção das estratégias de marketing dos candidatos, como é possível se trabalhar com o método proposto por Maquiavel?
Parece, em tese, uma tarefa razoavelmente simples: ver a realidade como ela é. Enxergar o mundo sem vieses, sem filtros, sem interferências. Analisar os “fatos como coisas” para usar um conceito de Durkheim, de forma objetiva, neutra, desapaixonada.
Contudo, engana-se quem pensa que tal empreitada é trivial.
É mais prudente afirmar que a objetividade e a neutralidade não existem em sua plenitude. O olhar humano, a seleção, a interferência do observador e do pesquisador sempre existirão em algum grau. Nestes termos, a objetividade deve ser entendida como uma busca, um projeto, uma meta, um desafio permanente a ser perseguido.
Quando Maquiavel proe o realismo como método, em tempos modernos, está a aproximar a política da ciência, vale dizer, do método científico. A ciência é, sem dúvida, a abordagem que mais intensamente busca a objetividade e a que mais dela se aproxima.
Fazer uma campanha eleitoral usando o realista proposto por Maquiavel é, portanto, empregar o método científico para interpretar a conjuntura política e, desta interpretação, extrair as emoções predominantes dos votantes que vão guiar as estratégias eleitorais.
Maquiavel, também, em O Príncipe escreve o seguinte: “assim como aqueles que desenham a paisagem se colocam nas baixadas para considerar a natureza dos montes e das altitudes e, para observar aquelas, se situam em posição elevada sobre os montes, também, para bem conhecer o caráter do povo, é preciso ser príncipe e, para bem entender o do príncipe, é preciso ser do povo”.
A proposta de Maquiavel é buscar um olhar complexo e multifacetado, que contenha a visão de cima (dos governantes, dos príncipes) e de baixo (dos governados, do povo). Esta abordagem, para a época em que o livro O Príncipe foi escrito, é absolutamente inovadora. Em um tempo em que predominava o elitismo e livros que apenas enalteciam as qualidades, muitas vezes divinas, dos poderosos, é revolucionária a propositura de interpretar o mundo a partir do olhar do povo, de baixo para cima.
Pois é este olhar, de cima para baixo, a partir da perspectiva do eleitor que deve predominar na interpretação da realidade política e emoldurar a construção das estratégias eleitorais.
Ocorre que em campanhas eleitorais há uma disputa de olhares, de vieses.
Muitos marketeiros, em boa parte enebriados pelos seus egos inflados, acham que a sua seleção, a sua leitura da conjuntura e dos sentimentos dos eleitores é superior aos demais. São guiados por suas experiências e intuições. É o viés de ego.
Existe também o viés político, típico de jornalistas e dos próprios políticos que vivem em uma bolha de informação. São impactados a todo momento por publicações de jornais, notas da imprensa, post de Twitter, pesquisas eleitorais etc. E acreditam que, de alguma maneira, os eleitores comuns pensam igual a eles. Ocorre que os eleitores não têm muito interesse por política ou pela eleição e pouco acesso a informações. Essa distorção, de interpretar o mundo dos cidadãos comuns a partir de uma lente distorcida da bolha super informada, é muito problemática. Alguns marketeiros também incorrem neste erro.
A busca permanente de quem trabalha profissionalmente com marketing político é enxergar a campanha a partir do olhar dos eleitores. Não é fácil. É comum haver uma batalha com os vieses em disputa.
Contudo, é muito necessário que predomine o olhar realista, desapaixonado, fruto desta perspectiva de baixo para cima, do olhar do eleitor. As pesquisas de opinião são o elemento chave neste processo. São elas que trazem a ciência para a campanha e oferecem a perspectiva do eleitor que deve sempre predominar.
Cabe ao marketeiro, buscando se livrar dos vieses, saber selecionar os aspectos essenciais, as emoções mais determinantes e canalizar estes elementos para a comunicação, resumi-los no conceito da campanha e definir um posicionamento que o candidato deve buscar na disputa eleitoral.
A estratégia de marketing não é uma simples tradução da vontade do eleitor em mensagens. A comunicação persuasiva precisa responder, a partir da aplicação da inteligência criativa, diversos objetivos: despertar o interesse, chamar a atenção, diferenciar o candidato dos demais e estimular a ação (no caso o voto).
Claro que este processo exige por parte do marketeiro capacidade analítica e interpretativa. Exige maturidade, experiência, estudo, preparo e inteligência emocional para não se deixar se contaminar pelo ego. A construção de estratégias eleitorais vitoriosas a partir de uma abordagem realista, científica e que privilegie sempre o olhar do eleitor deve ser encarada como uma busca permanente, uma meta a ser perseguida com o máximo de afinco. Não é uma tarefa fácil, mas é o que precisa ser feito
RODRIGO MENDES é estrategista de marketing político e comunicação pública e institucional com 25 anos de experiência. Coordenou 60 campanhas eleitorais e prestou consultoria para diversos governos, instituições, lideranças e empresas. É publicitário, sociólogo, especialista em marketing e mestre em Ciência Política. Autor de “Marketing Político – o poder da estratégia nas campanhas eleitorais”; “Marketing Eleitoral – Aprendendo com campanhas municipais vitoriosas” e dos e-books “A falha na distribuição da comunicação”; “O eleitor subconectado e a realidade do marketing eleitoral no Brasil”; “Marketing Governamental”; “Novas estratégias eleitorais para um novo ambiente político” e “DataMídiaPerformance”.
RODRIGO MENDES é estrategista de marketing político e comunicação pública e institucional com 25 anos de experiência. Coordenou 60 campanhas eleitorais e prestou consultoria para diversos governos, instituições, lideranças e empresas. É publicitário, sociólogo, especialista em marketing e mestre em Ciência Política.
Autor de “Marketing Político – o poder da estratégia nas campanhas eleitorais”; “Marketing Eleitoral – Aprendendo com campanhas municipais vitoriosas” e dos e-books “A falha na distribuição da comunicação”; “O eleitor subconectadoe a realidade do marketing eleitoral no Brasil”; “Marketing Governamental”; “Novas estratégias eleitorais para um novo ambiente político” e “DataMídiaPerformance”.