Faz parte do senso comum dizer que quase todo o Brasil está conectado. Segundo os últimos dados divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiros de Geografia e Estatística), em 2021, mais de 90% dos domicílios brasileiros já tinham acesso à internet. Contudo, falhas são comuns quando existe a necessidade de se utilizar a internet como meio de comunicação com a população. Nas campanhas eleitorais, a internet não é um meio 100% confiável para se distribuir propaganda. Se a abrangência da internet é tão alta, por que isso acontece?
Uma pesquisa realizada pela PwC/Locomotiva, divulgada em 2022 vem esclarecer este fenômeno. Segundo o instituto, 76% dos brasileiros com mais de 16 anos (ou seja, aqueles que podem votar) não conseguem usar a internet todos os dias. Esta dificuldade é mais frequente entre as pessoas das classes C, D e E, negros, moradores de periferias e entre os que têm menor escolaridade. As classes C, D e E representam 70,4% da população segundo a ABEP – Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa. Em média, o pacote de internet do celular esteve disponível para usuários das classes C, D e E somente por 23 dias no último mês. No segmento específico de usuários de pré-pago, a internet só esteve disponível 21 dias e, na classe DE, por 19 dias. Nos demais dias, o acesso à internet pelo 3G/4G esteve bloqueado.
Ou seja, a pesquisa mostra uma realidade bastante diferente daquela que concebe um Brasil conectado. 34 milhões de pessoas estão desconectados e 86,6 milhões não conseguem se conectar todos os dias. Ou seja, no Brasil, predominam os desconectados, os parcialmente conectados (44.8 mi) e os sub conectados (41.8 mi). Menos de 30% da população é plenamente conectada, especialmente nas classes A e B, com maior escolaridade.
Existe um abismo digital a separar ricos e pobres. Este é o país real.
Entre as pessoas que têm dificuldade de ter acesso ou de se conectar à internet as razões principais são – 68% o alto preço dos planos e aparelhos, 48% instabilidade no sinal, 44% velocidade baixa, 44% qualidade do sinal.
Existem ainda duas variáveis que se somam às precariedades já apontadas que dificultam mais a comunicação através da internet no Brasil. Primeiro, em função do tipo de serviço que se adquire, o acesso à internet e a determinadas redes socais é limitado. Segundo, e mais importante, a limitação do tamanho do pacote de dados.
Uma outra pesquisa realizada pelo IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, com o instituto Locomotiva, de 2021, esclarece como se comportam as classes mais baixas em relação à internet. Segundo a pesquisa, os planos pré-pagos predominam entre este perfil de internautas, seguido de planos controle (29%) e, por último, pós-pago. Em relação ao pré-pago, 58% dos internautas dessas classes afirmam possuir este tipo de plano, índice que cresce entre os mais jovens (71%) e entre os usuários das classes DE (71%). As Regiões Norte (66%) e Nordeste (69%), também, apresentam média superior de pré-pagos se comparados às demais regiões (51%).
A pesquisa aponta ainda que entre os usuários para os quais o pacote de dados contratado não foi suficiente para no último mês, 74% afirmaram que acessaram a internet somente em locais onde puderam acessar a rede por meio de Wi-Fi. Assim, estes consumidores acabam por adotar práticas de “autoprivação” para evitar o consumo do pacote de dados. Aproximadamente 80% deixam de acessar ou adiam o acesso a conteúdos ou desligam os dados móveis para economizar dados quando fora do Wi-Fi.
Uma característica que, também, marca a experiência do acesso à internet móvel dos consumidores mais pobres é o fato de que essa é a parcela de usuários que mais fica restrita aos conteúdos e aplicativos patrocinados após o término da franquia, podendo utilizar somente o WhatsApp e o Facebook, por exemplo.
Várias implicações decorrem desta realidade no comportamento dos eleitores e, consequentemente, nas táticas a serem empregadas nas campanhas eleitorais.
Conclusão. O Brasil conectado é um mito. Predominam os subconectados, com limitações de acessos a redes sociais e aos dados e existem severas dificuldades de se distribuir comunicação para quase 90% da população brasileira através da internet.
A prática do marketing eleitoral brasileiro exige que se conheça a fundo o perfil do nosso eleitor, especialmente das classes mais baixas. A realidade do Brasil profundo é um alerta aos marqueteiros que acham que o mundo se reduz ao digital. O Brasil é mais complexo e contraditório e fazer campanha eficiente é muito mais difícil do que se imagina.
Rodrigo Mendes é estrategista de marketing e comunicação pública com 25 anos de experiência. Publicitário, sociólogo, especialista em marketing e mestre em Ciência Política, coordenou 60 campanhas eleitorais e prestou consultoria para diversos governos, instituições e lideranças.
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RODRIGO MENDES é estrategista de marketing político e comunicação pública e institucional com 25 anos de experiência. Coordenou 60 campanhas eleitorais e prestou consultoria para diversos governos, instituições, lideranças e empresas. É publicitário, sociólogo, especialista em marketing e mestre em Ciência Política.
Autor de “Marketing Político – o poder da estratégia nas campanhas eleitorais”; “Marketing Eleitoral – Aprendendo com campanhas municipais vitoriosas” e dos e-books “A falha na distribuição da comunicação”; “O eleitor subconectadoe a realidade do marketing eleitoral no Brasil”; “Marketing Governamental”; “Novas estratégias eleitorais para um novo ambiente político” e “DataMídiaPerformance”.