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Por que a reeleição dos prefeitos bateu o recorde?
23/10/2024 / 10:44
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Em novembro de 2023 escrevi um artigo em que apontava algumas tendências que imagina que poderiam impactar na eleição de 2024. 

Vou resumir o que disse. 

Primeiro. Que o brasileiro estava cansado da polarização entre esquerda e direita. Esse conflito e seu acirramento, que muitas vezes gerou afastamentos dentro das famílias, causando traumas e estresse, já havia cansado. A maioria das pessoas não desejava mais estas brigas para sua vida e preferiam uma política menos tensa e mais distendida. Neste sentido, a polarização ideológica, mesmo nos grandes centros urbanos, parece que não teria a mesma força na eleição municipal.

Segundo. O eleitor estava avaliando bem a maioria dos prefeitos. A exceção de um ou outro caso cuja gestão seja muito aquém do esperado, a população está gostando das administrações municipais.   

Destaco esta parte: parece que haveria uma forte tendência favorecendo a reeleição dos atuais mandatários ou uma grande chance de estes conseguirem fazer seus sucessores, mesmo que a transferência de votos para outrem seja mais difícil. Em 2024, opositores que pregarem mudanças não encontrarão facilidade. Para o eleitor, o custo da mudança parece que vai pesar bastante. 

Terceiro. Associada a tendência de continuidade, o eleitor parece desejar segurança no próximo pleito. Segurança em um sentido psicológico. O eleitor não parece disposto a querer se arriscar. Tende a preferir o certo ao duvidoso. Parece preferir votar no próximo e no conhecido. 

Assim, se há um prefeito que está fazendo um trabalho bom ou razoável, “mesmo que sem muito brilho”, um “arroz com feijão temperadinho”, é melhor manter o que aí está trabalhando, do que “arriscar em alguém que a gente não conhece bem e a coisa correr o risco de desandar”. Uma fala de um eleitor resume bem a tendência: “pra que mudar só por mudar, tem que ser para melhorar, né? E se a gente não conhece direito, pode ser que piore. As coisas pelo menos estão funcionando. Aí é melhor ficar com o que a gente já conhece”.   

Quarto. O eleitor busca um gestor que cuide bem da cidade, do bairro e da rua. Há mais um desejo de um síndico da cidade, um administrador dos problemas do cotidiano. Predominará na eleição municipal um localismo, um foco nos problemas locais e próximos. Nacionalizar a eleição não parece um caminho muito promissor. 

Agora no primeiro turno da eleição de 2024 todas estas tendencias que apontei no ano passado se confirmaram. A reeleição de prefeito bateu record histórico: 81% dos atuais prefeitos se reelegeram, ou seja, de cada 10 que concorreram a reeleição, 8 foram vitoriosos. A taxa histórica média de reeleição era na casa dos 60%. 

A pergunta é, o que explica o record da reeleição de prefeitos?

Primeiro. Se percebe na conjuntura, seja econômica, social ou política uma certa normalidade, não existem grandes fatos que possam produzir fenômenos eleitorais de maior envergadura a ponto de alterar a tendência inerente ao ser humano de ser conservador e ter medo de mudanças. Como predomina a normalidade, não há uma aversão generalizada aos políticos ou uma pandemia como ocorreram no passado, as pessoas preferem ficar com o que já está no cargo, fazendo a coisa funcionar (mesmo que razoavelmente) a apostar no desconhecido. 

É interessante, quando se estuda a psicologia, que existe um conceito que nomeia o medo da mudança: a tropofobia. Em graus mais acentuados, este fenômeno seria uma fobia específica que se torna patológica quando impede a pessoa de aceitar mudanças naturais na vida. 

O medo de mudar se refere ao pensamento associado a dificuldade das pessoas de se adaptarem a uma nova situação. Na psicologia, as razões para o medo de mudanças podem ser: apego à rotina, personalidade inflexível, mania de controlar detalhes da vida, ansiedade associada e eventos futuros e desconhecidos. 

Sociologicamente, outras razões podem ser elencadas, como uma cultura conservadora e a aversão a mudança, entendida como ameaça as instituições, aos valores e as crenças da comunidade; desconfiança e rejeição à política, que gera uma visão de que é melhor ficar com o conhecido, mesmo que precário, neste caso, votar no mandatário atual, do que apostar em algo desconhecido, que possa representar um risco de piora.

Interessa notar que, os prefeitos bem avaliados, independente de seu partido ou ideologia, conseguiram superar a polarização. Estes prefeitos foram votados tanto por esquerdistas/lulistas quanto por direitistas/bolsonaristas. Ou seja, o voto retrospectivo, que considera o desempenho administrativo passado do candidato, foi um fator preponderante a explicar a vitória dos prefeitos que buscaram a reeleição. 

Também se constata que a discussão da eleição foi dominada por temas locais. Não se percebeu a nacionalização do pleito em quase nenhuma cidade. Os temas eram a saúde, a mobilidade, a segurança, a zeladoria, a educação ou temas específicos da localidade como moradores de rua, uma lagoa ou rio poluído, as enchentes, a corrupção em algum órgão municipal específico etc.    

Outras hipóteses ainda poderiam ser mais estudadas para explicar melhor o record na reeleição de prefeitos. 

Uma primeira hipótese é a de que, por estarem no mandato, os prefeitos conseguiram atrair mais partidos para a sua coligação. Em sendo assim, teriam mais recursos financeiros (via fundos partidários e eleitorais) e, consequentemente, mais tempo de TV e rádio para fazer suas campanhas, como também, mais candidatos a vereadores, um exército maior nas ruas para levar a sua mensagem. Neste pleito, indiscutivelmente, a TV e o rádio fizeram muita diferença e quem teve mais acesso a estes recursos, em regra, acabou tendo um desempenho melhor.

Segundo. É historicamente constatado o fato de que a reeleição e a permanência dos prefeitos no cargo, quando buscam sua reeleição, gera uma assimetria entre os candidatos. O prefeito no mandato consegue mobilizar forças, que só ele, tem na mão. Essas forças, sobretudo quando bem conjugadas com o marketing eleitoral, o ajudam a aumentar as suas chances de vitória. A máquina pública, se bem utilizada, pesou a favor dos atuais mandatários? Em algumas cidades este fenômeno foi amplamente constatável. 

Fiquemos apenas com estas duas hipóteses, que serão estudadas e trazidas em artigos futuros, para que se busque explicar o que aconteceu na eleição de 2024.

Em resumo, destaca-se: predominou o comportamento socialmente conservador e o medo da mudança; a boa avaliação da maior parte dos prefeitos e o comportamento eleitoral baseado no voto retrospectivo; a municipalização da disputa e o domínio de temas locais; e, por fim, uma menor polarização ideológica. 

Agora é seguir o estudo para aprofundar a análise e ver se existem outras correlações de variáveis que expliquem o record histórico da reeleição dos prefeitos.

RODRIGO MENDES é publicitário, sociólogo e cientista político, estrategista de marketing e comunicação pública com 25 anos de experiência, já tendo coordenado 63 campanhas eleitorais e prestado consultoria para diversos governos, instituições e lideranças. Autor dos livros – MARKETING POLÍTICO: O PODER DA ESTRATÉGIA NAS COMPANHAS ELEITORAIS. OS SEGREDOS DA GESTÃO PÚBLICA EFICIENTE. MARKETING ELEITORAL: APRENDENDO COM CAMPANHAS MUNICIPAIS VITORIOSAS e NOVAS ESTRATÉGIAS ELEITORAIS PARA UM NOVO AMBIENTE POLÍTICO.

sobre
Rodrigo Mendes
Rodrigo Mendes

RODRIGO MENDES é estrategista de marketing político e comunicação pública e institucional com 25 anos de experiência. Coordenou 60 campanhas eleitorais e prestou consultoria para diversos governos, instituições, lideranças e empresas. É publicitário, sociólogo, especialista em marketing e mestre em Ciência Política.

Autor de “Marketing Político – o poder da estratégia nas campanhas eleitorais”; “Marketing Eleitoral – Aprendendo com campanhas municipais vitoriosas” e dos e-books “A falha na distribuição da comunicação”; “O eleitor subconectadoe a realidade do marketing eleitoral no Brasil”; “Marketing Governamental”; “Novas estratégias eleitorais para um novo ambiente político” e “DataMídiaPerformance”.