Situado em uma das regiões mais frias do mundo, o Ártico possui cerca de 21 milhões de quilômetros quadrados, sendo que desse total 65% é composto pelo Oceano Glacial Ártico. Com as mudanças climáticas, no entanto, a região vem sofrendo alterações significativas – antes do esperado, o Ártico pode ter seu primeiro verão sem gelo.
De acordo com um estudo publicado pela revista britânica Nature, o primeiro dia sem gelo na região pode acontecer até a década de 2030. O professor Paulo Artaxo, do Departamento de Física Aplicada do Instituto de Física da USP, alerta sobre os impactos que esse derretimento das geleiras pode causar no meio ambiente:
“É importante perceber que o Ártico é uma das regiões que estão se aquecendo de maneira mais rápida em todo o planeta. E a previsão dos modelos climáticos do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas indicam um aumento de temperatura de 7° a 8° para o Ártico ao longo dos próximos 30, 40 anos, a depender do cenário de emissões. Isso realmente está impactando o ecossistema Ártico de uma maneira muito forte, com o derretimento do gelo marinho e também com o derretimento de geleiras continentais, o derretimento dessas geleiras continentais ocasionam aumento do nível do mar”, afirma.
Os pesquisadores analisaram as mudanças de 1979 a 2019, comparando diferentes dados de satélite e modelos climáticos para avaliar como o gelo marinho do Ártico estava mudando, e eles perceberam que o declínio do gelo marinho foi, em grande parte, resultado da poluição causada pelo homem que aquece até hoje o planeta.
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Com a alteração de seu habitat natural, os ecossistemas podem entrar em colapso. As geleiras são habitats importantes para várias espécies. O derretimento pode ameaçar a biodiversidade, afetando cadeias alimentares e ecossistemas inteiros. Não são apenas a fauna e a flora que sofrem com o aquecimento global, mas sim, também, a sociedade. Paulo Artaxo explica as consequências mundiais que o derretimento dessa região pode causar e acrescenta a dificuldade de previsão precisa dessas mudanças.
“Esse derretimento vai alterar a circulação do oceano e isso é muito importante, porque a circulação oceânica redistribui fortemente o calor de regiões tropicais para regiões temperadas, como, por exemplo, a corrente do Golfo no Atlântico Norte. Isto vai trazer mudanças na distribuição de temperatura, mudanças na distribuição de precipitação e chuvas no mundo inteiro”, discorre.
O permafrost, ou solo permanentemente congelado, desempenha um papel significativo nas discussões sobre o aquecimento global. Ele armazena grandes quantidades de carbono na forma de matéria orgânica que, ao longo de milhares de anos, ficou presa no gelo. Quando o permafrost começa a descongelar devido ao aumento das temperaturas globais, esse carbono é liberado na forma de dióxido de carbono e metano, dois potentes gases de efeito estufa.
Esse processo de liberação de gases pode acelerar o aquecimento global, criando um ciclo vicioso: o aquecimento provoca o descongelamento do permafrost, o que, por sua vez, libera mais gases de efeito estufa, aumentando ainda mais as temperaturas. O professor comenta sobre o impacto desse processo de aquecimento e a dificuldade de previsões precisas. “É uma mudança tão drástica, que hoje é difícil você fazer uma previsão com alta precisão de quais serão essas mudanças, onde e quando. Mas, dada a magnitude da influência do Ártico no clima global, nós temos certeza que esse impacto vai ser muito significativo. Então, nós temos grandes quantidades de metano não armazenadas no gelo sobre o Oceano Ártico, mas armazenadas no que a gente chama de permafrost, que são regiões continentais da Sibéria e do Canadá, principalmente onde bactérias e matéria orgânica que estão lá há milhões de anos, ao se decompor, emitem metano para a atmosfera”, reitera.
Apesar de os danos ao planeta já serem irreversíveis, ainda se faz necessário encontrar formas de tentar desacelerar o derretimento do Ártico. Para isso, Paulo Artaxo recomenda a mudança imediata de ações do ser humano. “O aquecimento global, que já ultrapassou 1,5° Celsius, em média, em todo o planeta, está fazendo com que esse derretimento do gelo do Ártico e do gelo armazenado na Groenlândia, no Canadá e na Sibéria seja irreversível. Então, não há como hoje refrear o aquecimento que a gente provocou ao longo dos últimos 30, 40 anos. Entretanto, reduzir emissões de gás de efeito estufa hoje é a melhor maneira de prevenir futuros desastres climáticos como esse do derretimento do gelo do Ártico. Temos que reduzir as emissões de gás de efeito estufa, temos que terminar a exploração de combustíveis fósseis em todo o planeta e acabar com o desmatamento de florestas tropicais como a da Amazônia. Isso é uma tarefa urgente se quisermos diminuir os impactos das mudanças climáticas no clima global do nosso planeta”, conclui.
*Com informações do Jornal da USP