Após a última apresentação de “José” deste ano, junto ao público paraibano no último dia 12 de novembro, o cantor e compositor maranhense Zeca Baleiro bateu um papo com o repórter Paulo Santos. A conversa bem-humorada rendeu curiosidades sobre os momentos de lazer do artista, além dos novos formatos de interação no palco.
Os adiamentos de shows por causa da pandemia, os 25 anos de carreira de Zeca e os nordestinos Jackson do Pandeiro e João do Vale estiveram na pauta. Confira, abaixo, a entrevista exclusiva disponível para o portal F5 Online e para o Podcast Fatos e Canções.
PS: O senso comum é que um show desses é repetido, e igual em cada local. Muda só o nome da cidade. Mas eu acho que não. Na minha opinião, um show, um artista não consegue fazer a mesma coisa duas vezes, mesmo tendo um roteiro. Nesse show de hoje, considerando tudo, o que é que você mudaria se houvesse necessidade de mudar?
ZB: Hoje foi tão bom que eu não mudaria nada. Mas esse show, especialmente esse “José”, que tem um roteirinho todo criado por mim, ele realmente nunca se repete. Normalmente eu não repito muito show não, porque eu gosto de trazer uma surpresa não só para o público, mas para mim, para a banda, para os músicos que me acompanham. Porque quando você fica muito tempo na estrada repetindo a mesma coisa, começa a ficar um pouco mecânico. Então, no mínimo eu inverto a ordem, eu mudo a ordem ou eu ponho uma música que não estava no repertório, que é para trazer uma nova sensação, uma adrenalinazinha. Esse show, especialmente, ele realmente nunca se repetiu porque, como tem além de músicas – o repertório é sempre móvel – tem os livros e os discos… Cada dia eu leio poemas diferentes. A cada dia eu ponho discos diferentes, eu conto histórias diferentes e tal. Então é um show que ninguém viu ainda esse show se repetir, em todas as 12 cidades por onde a gente passa.
Link do show em JP – Instagram de Zeca Baleiro
PS: É isso que eu senti. Eu só queria confirmar isso. Eu vi muito nesse show, um espírito de pandemia. Zeca num quadrado, numa casa que é o palco, e transmitindo ao vivo uma live para um público que interage através de mensagens. Então, a conexão existe, mas a conexão é um pouco, digamos assim, menos quente do que num show tradicional. Mas nem por isso o formato deixa de ser interessante. Para mim, ele é fantástico. Adorei e acho que todo mundo que veio adorou também. É outra experiência. Como surgiu o formato desse show? A pandemia realmente tem alguma coisa a ver com isso?
ZB: Olha, esse show eu fiz, a primeira vez, para um projeto, meio sob encomenda, lá em Porto Alegre, para a Universidade Federal de lá. Não só eu, mas outros artistas também eram convidados a tocar suas canções e contar um pouco das histórias, das referências, das coisas de formação e dizer os compositores, os discos, os livros, os poetas que o influenciaram e tal. E isso me deu um estalo. Eu só fiz essa apresentação e deixei o show repousando. Quando veio a pandemia, eu quis reativar o show. Tanto que esse show aqui em João Pessoa está marcado há uns três anos. Ele foi sendo cancelado, adiado, postergado… até que a gente fez agora. Aí, eu falei… poxa, eu podia, depois da pandemia, viajar com esse show. Várias razões me fizeram pensar isso. Uma, porque eu estava fazendo 25 anos de carreira este ano. Então, era um momento bom para começar a contar uma história, 25 anos é bastante tempo. Muitas histórias, muitos fatos curiosos, engraçados até. E outra, pela própria situação que a pandemia deixou, de insegurança econômica e tal. E era um show fácil de viajar, isso também contou. Somos cinco pessoas na equipe, quase um pocket show. O volume é do maquinário, dos equipamentos e máquinas e computador. Mas enfim, perto de um show com banda, é muito mais compacto.
PS: Isso ainda emociona do mesmo jeito do que com a banda?
ZB: Acho que sim, porque traz outro tipo de emoção. A banda tem aquele peso sonoro, impacto que faz dançar, que faz vibrar. Mas o artista sozinho com seu violão, ele suscita outras emoções. Até acho que você canta mais emocionado, você põe mais voz na coisa, imprime mais força na interpretação que você tem que se virar sozinho. Você está com um jogador a menos. Não raro, eu me emociono muito nesse show.
PS: Eu me lembrei muito de Stephen Fry, o ator e toda a iconografia. Conectei a você falando de novela e séries. Porque para mim novela é série, mesma coisa, é o mesmo formato. A série é a novela do passado. Você, como noveleiro, também gosta de séries? Se gosta de séries, indica uma série para a gente e diz quem é que você gostaria de ser nessa série.
ZB: (Risos) Boa! Eu seria o milionário de Billions (risos), que domina tudo, só pensa em dinheiro. Mas tem uma série que eu acabei de ver que é muito interessante, que se chama White Lotus. Já está na segunda temporada. Ela se passa nos hotéis. O primeiro episódio é no Havaí e agora o segundo na Sicília, na Itália. É muito interessante porque é um texto muito moderno. São poucos personagens, mas as discussões são muito atuais desse novo mundo que está se descortinando aí. É muito bacana, além de divertido.
PS: Uma música de série que você…
ZB: A trilha dessa série. Até andei pesquisando. Esse compositor se chama Cristóbal… um nome triplo, Cristóbal Tapia… um negócio assim. Parece um nome meio martinica ou surinamês, mas é holandês. É interessantíssimo! Muito interessante a trilha dele, porque é pouquinho, econômica, mas são uns temas muito interessantes.
PS: Zeca você fez uma referência muito simpática a Cassiano, que é um cara genial. É um conterrâneo meu, um cara que morreu no ostracismo. Mas deu uma contribuição que ninguém duvida para a música brasileira, principalmente com o soul. Mas nós temos outra, que é Jackson do Pandeiro, claro, você sabe muito bem. Eu queria fazer uma pergunta que é um exercício de imaginação. Eu quero que você se imagine no palco. De repente, as luzes se apagam e fica aquela coisa tênue, e você não vê mais a plateia, vê só um senhor idoso acompanhado de uma pessoa que o guia, e você encara essa pessoa e descobre que é Jackson do Pandeiro. Obviamente, você vai chamá-lo para o palco. Nessa situação hipotética…
ZB: Eu sairia do palco com vergonha dele (risos)!
PS: Que música você gostaria de cantar com ele, acompanhá-lo?
ZB: Ah, O Canto da Ema! Porque é muito simbólico e, além de ser um clássico que Jackson recriou cantando, é de autoria do meu conterrâneo João do Vale, que é outro nome importantíssimo para a música nordestina, de uma maneira geral. O Canto da Ema é sensacional!
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Série e cantor citados por Zeca Baleiro na entrevista:
– Série White Lotus
https://www.hbomax.com/br/pt/series/urn:hbo:series:GYLD3_ArixL1sggEAAAHk
-Cristobal Tapia de Veer
https://en.wikipedia.org/wiki/Cristobal_Tapia_de_Veer
-Compositor de trilha sonora
Juan Cristobal Tapia de Veer é um compositor, arranjador, produtor e multi-instrumentista canadense de origem chilena para cinema e televisão, baseado em Montreal, Quebec, Canadá. Wikipedia (inglês).
Em 2021, ele compôs a trilha sonora série da HBO The White Lotus, pela qual ganhou dois Primetime Emmy Awards (um pela música-título (tema de abertura) e o outro por seu trabalho no restante da trilha sonora da série e um Prêmio da Sociedade de Compositores e Letras. Ele também recebeu sua segunda indicação ao BAFTA pela trilha da minisérie britânica, também da HBO, The Third Day.