16/04/2021
MARINA DIAS
WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – O governo Joe Biden reconheceu publicamente pela primeira vez nesta sexta-feira (16) a importância do compromisso do presidente Jair Bolsonaro em acabar com o desmatamento ilegal até 2030 no Brasil, mas pediu “ações imediatas” e “engajamento com as populações indígenas e sociedade civil” para que a promessa possa gerar resultados que os americanos classificam como tangíveis.
O porta-voz do recado foi o enviado especial para o clima de Biden, John Kerry, que escreveu em seu Twitter uma mensagem marcando Bolsonaro.
“O novo compromisso do presidente Jair Bolsonaro de eliminar o desmatamento ilegal é importante. Esperamos ações imediatas e engajamento com as populações indígenas e sociedade civil para que seu anúncio possa gerar resultados tangíveis.”
Em carta enviada a Biden na quarta-feira (14), Bolsonaro se comprometeu a acabar com o desmatamento ilegal em território brasileiro até 2030 e ponderou que a meta “exigirá recursos vultosos e políticas públicas abrangentes.”
Até agora, integrantes do Departamento de Estado americano e funcionários da Casa Branca comentavam o conteúdo do texto apenas nos bastidores, celebrando a promessa, mas pressionado por resultados ainda neste ano e medidas concretas que mostrassem o caminho para atingir a meta.
Zerar o desmatamento até 2030 foi um compromisso feito pelo Brasil em 2015, no âmbito do Acordo de Paris, mas essa foi a primeira vez que Bolsonaro se comprometeu com o número, em promessa considerada de alto nível diplomático, feita diretamente a Biden.
Bolsonaro é um dos 40 líderes convidados pelo presidente americano para participar da cúpula do clima organizada por Washington nos dias 22 e 23 de abril. O presidente brasileiro deve falar na sessão de abertura, ao lado de EUA e China, dedicada aos países que são maiores emissores ou têm credenciais ambientais importantes.
Segundo auxiliares, o presidente brasileiro deve repetir as promessas que fez na carta a Biden, destacando, inclusive, sua disposição em trabalhar com o terceiro setor e indígenas, assim como pediu Kerry nesta sexta.
“Queremos ouvir as entidades do terceiro setor, indígenas, comunidades tradicionais e todos aqueles que estejam dispostos a contribuir para um debate construtivo e realmente comprometido com a solução dos problemas”, escreveu Bolsonaro na carta enviada à Casa Branca.
A política ambiental de Bolsonaro é considerada negligente por ambientalistas e coleciona recordes de desmatamento, queimadas e sucateamento de órgãos fiscalizadores. Em seus dois primeiros anos de mandato, o presidente brasileiro acusou governantes estrangeiros de questionarem a soberania brasileira sobre a Amazônia, atacou ONGs e criticou líderes indígenas.
A carta, portanto, foi considerada por autoridades americanas uma mudança de tom, mas a pressão de que é preciso ver resultados para além de promessas continua.
No mesmo dia da declaração de Kerry, senadores democratas enviaram uma carta a Biden pedindo que a Casa Branca só libere fundos ao Brasil para a ajudar na preservação da Amazônia se houver um compromisso sério do governo Bolsonaro com a redução do desmatamento e punição a crimes ambientais.
Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, Bolsonaro avalia anunciar, durante a cúpula da semana que vem, aumento da verba para o Ministério do Meio Ambiente, principalmente para as agências como Ibama e ICMBio, na tentativa de fazer essa sinalização de ações concretas que pedem os EUA.
O financiamento para a preservação da Amazônia se tornou um dos grandes pontos de tensão nas negociações entre EUA e Brasil na preparação para a cúpula do clima.
Desde o fim do mês passado, Casa Branca e Departamento de Estado pedem um plano ambicioso e real sobre mudanças climáticas por parte do Brasil, mas condicionam qualquer tipo de ajuda financeira a resultados concretos.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, por sua vez, insiste na ideia de que o Brasil vai se comprometer com números apenas se receber dinheiro antecipado de países estrangeiros, o que desagrada aos americanos.
O ministro chegou a pedir US$ 1 bilhão até 2021 em reunião com autoridades dos EUA para ajudar na preservação da Amazônia e, como revelou a Folha de S.Paulo, mostrou uma imagem de um cachorro abanando o rabo em frente de frangos assados para ilustrar o que chamou de “expectativa de pagamento”.
Salles avalia que o Brasil também precisa receber recursos de compensação de preservações já feitas, como a redução de 7,8 bilhões de toneladas de carbono de 2006 a 2017.
Na carta a Biden, Bolsonaro escreve que alcançar a meta de zerar o desmatamento ilegal até 2030 “exigirá recursos vultosos e políticas públicas abrangentes”, mas auxiliares do presidente brasileiro dizem saber que essa ajuda virá “à medida em que concretizarmos compromissos assumidos.”