O Brasil pode movimentar bilhões de reais em investimentos no setor de gás natural, mas enfrenta um gargalo estratégico: a ausência de infraestrutura adequada para estocagem subterrânea, ferramenta essencial para garantir segurança energética, estabilidade de oferta e competitividade no mercado.
Esse foi o principal alerta feito durante o painel “Flexibilidade para o Aumento da Oferta e Competitividade” no Congresso Energia 360 Alagoas, promovido pela Origem Energia, em Maceió. O debate reuniu autoridades regulatórias e lideranças empresariais, que defenderam a criação de um marco operacional sólido para a estocagem no Brasil, um movimento considerado essencial para destravar a transição energética e ampliar o dinamismo econômico nacional.
A diretora da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Symone Araújo, destacou que o projeto de estocagem em desenvolvimento pela Origem Energia e pela TAG é a primeira experiência regulatória do gênero no país, e ressaltou que a agência reguladora realiza uma abordagem inovadora e multissetorial.
“É uma experiência inédita, que mobiliza várias áreas técnicas da ANP, desenvolvimento e produção, segurança operacional, infraestrutura, regulação e defesa da concorrência. A operação de poços de injeção, retirada e monitoramento exige um regime diferente do que se aplica à produção convencional de gás”, explicou.
Symone detalhou que o acesso à estocagem, desde o início da operação, será livre, transparente e negociado entre os agentes, com mediação da ANP quando necessário. “É uma infraestrutura essencial que não pode servir para concentrar poder ou criar barreiras de entrada no mercado. A proposta garante isonomia e flexibilidade.”
O CEO da TAG (Transportadora Associada de Gás S.A.), Tomaz Guardagnin, apontou que o Brasil precisa urgentemente superar gargalos estruturais para avançar em segurança energética. Mesmo com uma malha de transporte extensa, com cerca de 4,5 mil quilômetros que é a extensão do que atende a TAG, o país ainda sofre com restrições de fluxo, falta de interconexões e de instrumentos modernos de negociação e redistribuição de gás.
“Quando falamos de flexibilidade e resiliência, não basta estocar. É preciso resolver o sistema como um todo, remover gargalos, melhorar os fluxos e criar mecanismos como linepacking, zeramento de posições e plataformas eletrônicas de gás”, afirmou.
Segundo ele, países como Estados Unidos e Europa utilizam estocagem há mais de 70 anos, o que os torna mais preparados para lidar com oscilações de mercado, crises geopolíticas e picos de consumo.
Para o diretor de estocagem da Origem Energia, Anderson Bastos, o modelo desenvolvido em parceria com a TAG é um passo essencial para modernizar o mercado brasileiro. Ele destacou que o contrato adotado traz flexibilidade para negociações ágeis de curto e longo prazo, o que estimula liquidez e atratividade comercial.
“A estocagem é uma ferramenta essencial na gestão de portfólios de gás. Em mercados maduros, ela é integrada aos mecanismos de comercialização. O Brasil precisa avançar nisso para ter mais competitividade e previsibilidade. Esse projeto coloca o país no caminho certo”, declarou.
Bastos também ressaltou que a liquidez do mercado é condição básica para o desenvolvimento econômico, e que o armazenamento de gás garante estabilidade tanto para produtores quanto para consumidores, reduzindo riscos e facilitando decisões de investimento.
O painel evidenciou um consenso: sem infraestrutura de estocagem e transporte, o Brasil não conseguirá cumprir seus objetivos de transição energética nem atrair investidores de forma sólida.
Além da questão regulatória, os especialistas reforçaram a importância da integração entre políticas públicas, operadores e transportadoras para acelerar a implementação desses projetos, que representam não apenas estabilidade energética, mas também desenvolvimento industrial, geração de empregos e crescimento regional.
“A estocagem é uma peça-chave para o futuro do setor energético brasileiro. Sem ela, a matriz perde resiliência, o mercado perde competitividade e a economia nacional perde agilidade”, concluiu Symone Araújo.