SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Num espaço reservado do restaurante Président, do midiático chef francês Erick Jacquin, representantes da nata da direita paulistana se reuniram há duas semanas para serem apresentados a um novo instituto de defesa de ideias conservadoras e liberais.
O principal chamariz do evento, ocorrido na noite de 7 de junho, era o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). O filho do presidente é o idealizador do ICL (Instituto Conservador-Liberal), que ele tenta colocar em pé desde o final do ano passado.
A plateia, de cerca de 40 pessoas, tinha um mix de empresários, representantes do mercado financeiro, ativistas e influenciadores digitais. Em sua maioria simpatizantes do governo de Jair Bolsonaro (sem partido).
Eles ouviram uma explanação sobre o propósito do instituto e, num sutil apelo por doações, argumentos sobre a importância de que seja financeiramente sustentável, sem dinheiro público. Muitos se comprometeram a fazer contribuições.
Do mundo econômico estavam lá, entre outros, os empresários Otávio Fakhoury, Andre Kissajikian (incorporadora AK Realty) e Gabriel Kanner (Instituto Brasil 2000), o presidente do Instituto Mises Brasil, Hélio Beltrão, além dos investidores Edu Cavendish (Somas) e Pablo Spyer, conhecido pelo Minuto Touro de Ouro, canal que mantém no YouTube com dicas sobre ações na Bolsa.
Da esfera política compareceram os deputados estaduais Frederico D’Avila e Gil Diniz (eleitos pelo PSL e expulsos do partido) e o ex-candidato a prefeito de São Paulo pelo Novo, Filipe Sabará.
Entre influenciadores digitais e comunicadores, participaram os comentaristas políticos Caio Coppolla e Adrilles Jorge, o jornalista Luís Ernesto Lacombe, além de Henrique Viana, sócio da produtora de vídeos Brasil Paralelo, e da DJ Pietra Bertolazzi.
Foi o evento mais importante do ainda embrionário instituto desde que teve o lançamento anunciado em dezembro, em Brasília. Encontros menores já aconteceram em Belo Horizonte (MG) e Balneário Camboriú (SC).
“A longo prazo, queremos investir na formação de quadros e desenvolvimento de políticas públicas pela ótica conservadora-liberal”, diz Sérgio Sant’Ana, 43, diretor-executivo do ICL.
Advogado, ele foi assessor do ex-ministro Abraham Weintraub (Educação) e é o braço operacional da entidade, enquanto Eduardo Bolsonaro é o presidente.
“Já temos o CNPJ e uma equipe de quatro pessoas trabalhando, com redes sociais e parte administrativa. Por enquanto de forma voluntária, mas eu vou pagar salários para todos”, diz Sant’Ana, que também diz desempenhar a função voluntariamente.
O ICL busca uma sede física em Brasília e já tem alguns responsáveis setoriais. Na segurança pública, é o deputado federal Capitão Derrite (PP-SP), e na educação, Ilona Becskeházy, ex-secretária de Educação Básica do MEC.
A ambição é tornar o ICL uma referência na formulação e difusão de ideias conservadoras nos costumes e liberais na economia, o que se reflete no próprio nome da entidade. Foi essa mescla que levou à eleição de Bolsonaro em 2018.
O principal modelo, afirma Sant’Ana, é a Heritage Foundation, um dos principais centros de estudos da direita americana, fundado em 1973. Outra referência é a American Conservative Union (União Conservadora Americana), que organiza o Cpac, maior evento anual direitista dos Estados Unidos.
Em 2019, Eduardo Bolsonaro organizou uma versão brasileira do Cpac, em São Paulo. Uma segunda edição, desta vez promovida pelo ICL, deve ocorrer no segundo semestre deste ano, em Brasília.
Tanto a Heritage quanto a ACU são alinhadas ao Partido Republicano dos EUA, embora sem ligação formal com a legenda, e apoiam o ex-presidente Donald Trump.
Nas redes sociais do ICL, há um vídeo em que Matt Schlapp, presidente da ACU, parabeniza Eduardo pelo instituto e repete a versão fantasiosa de que houve fraude na derrota eleitoral de Trump para Joe Biden.
“Estamos muito preocupados com a infiltração do socialismo nos EUA e a fraude generalizada na última eleição”, diz ele. A seu lado, sua mulher, Mercedes, reforça: “A mídia fake news decidiu que Biden é o presidente eleito”.
Segundo Sant’Ana, o fato de o filho de Bolsonaro presidir um instituto conectado à direita trumpista não deve causar constrangimento à diplomacia brasileira.
“Essas instituições [Heritage e ACU] não têm relação com o Partido Republicano, mas com as ideias e valores do movimento conservador americano. E são as ideias que elegeram o presidente Bolsonaro e o Eduardo”, afirma.
Da mesma forma, afirma ele, o instituto é totalmente independente do governo, mesmo sendo presidido por Eduardo. “O instituto é uma questão totalmente privada, teremos distância do governo”, declara.
Segundo ele, a esquerda brasileira criou o conceito da “ONG do G, a ONG governamental”. “Não é o que queremos”, diz.
Por isso o apelo por financiamento privado. Em seu site, o ICL tem planos de assinatura mensal de R$ 25 a R$ 500, além da possibilidade de doações de até R$ 5.000. O diretor não revela quanto já foi arrecadado e diz que a ideia é ter uma estrutura de funcionamento enxuta.
No evento no restaurante, a discussão sobre a formação do instituto misturou-se, inevitavelmente, à questão eleitoral, com um diagnóstico de que a direita tem de se preparar para enfrentar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no ano que vem.
Isso gerou desconforto em alguns participantes. “Acho a ideia de um think tank liberal-conservador excelente, mas pareceu desvirtuada pelo caráter predominantemente político do evento. Saí frustrado”, diz Hélio Beltrão.
Outros, como Filipe Sabará, se mostraram mais receptivos. “É uma entidade que tem como premissa não receber dinheiro público, o que a diferencia das ONGs da esquerda. E que defende pautas de proteção à família, ideias liberais na economia e a propriedade privada”, afirma.
Para o investidor Edu Cavendish, que também estava lá, faltava um instituto conservador no Brasil que tenha relação com o grande capital.
“Enquanto temos iniciativas de esquerda muito bem estabelecidas, o movimento conservador é muito desorganizado. É uma desordem completa, não é orgânico”, diz Cavendish, fundador de uma plataforma de auxílio a investimentos de startups.
Ainda neste ano, o ICL quer colocar de pé, além da versão brasileira da Cpac, cursos de formação.
No ano que vem, mais estruturado, o instituto poderá dar subsídios para a campanha eleitoral de Bolsonaro, embora Sant’Ana diga que esse não é o objetivo.
“Não é o nosso foco envolvimento com política eleitoral. As ideias que a gente defende podem ter algum tipo de sobreposição, mas não seremos um partido político”, afirma.