Um laudo pericial revelou que os carros onde estavam os cinco jovens mortos durante uma ação policial entre João Pessoa e Conde, no dia 15 de fevereiro, foram atingidos por mais de 90 tiros, quase todos disparados de fora para dentro dos veículos. A única exceção foi um tiro efetuado de dentro de um dos carros. As informações são da série “Ele tinha envolvimento…”, da TV Cabo Branco.
As vítimas foram identificadas como Fábio Pereira da Silva Filho, 26 anos; Emerson Almeida de Oliveira, 25; Alexandre Bernardo de Brito, 17; Cristiano Lucas, 17; e Gabriel Cassiano de Sousa, 17, filho de Ana Gabriela, morta horas antes vítima de feminicídio. Segundo a Polícia Militar, os jovens planejavam vingar a morte dela e teriam trocado tiros com os policiais, versão contestada por familiares.
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O laudo da perícia apontou 74 disparos em um dos veículos e 18 no outro. Todos os tiros partiram de fora, com apenas um vindo de dentro para fora. Ainda segundo o documento, os veículos foram levados pelos próprios policiais ao pátio da Central de Polícia Civil antes da realização da perícia, o que gerou críticas. “Não houve perícia no local do confronto e não se sabe em que condições os veículos foram trazidos à Central de Polícia, o que gera questionamentos sobre a preservação dos vestígios”, diz a perícia.
A guia de atendimento do Hospital de Emergência e Trauma de João Pessoa mostra que os cinco jovens chegaram mortos, com múltiplos ferimentos por arma de fogo no crânio, tronco e membros inferiores. A causa das mortes foi, em todos os casos, traumatismo cranioencefálico com hemorragia torácica.
Seis policiais militares prestaram depoimento à Polícia Civil. Um deles afirmou que todos atiraram, mas não soube precisar quantos disparos fez. A defesa dos agentes afirma que eles reagiram após resistência das vítimas e prestaram socorro, negando qualquer ilegalidade.
A série da TV Cabo Branco revelou o depoimento de uma testemunha anônima, relatado por familiar de uma das vítimas, que afirma ter visto um policial com o pé no pescoço de Cristiano Lucas, que estaria fora do carro e com o rosto no chão. Segundo essa versão, quatro jovens estavam fora do veículo no momento da abordagem, e depois todos apareceram mortos dentro do carro.
O Ministério Público da Paraíba instaurou um procedimento para fiscalizar o andamento das investigações. “Os veículos deveriam estar no local, deveria ter sido preservado, isolado e chamada a Polícia Civil imediatamente, algo que não está acontecendo nos confrontos policiais. A Polícia Militar não está acionando, o que precisa ser corrigido”, destacou o promotor Túlio Fernandes.
Ele também reforçou que, caso fique comprovado abuso ou dolo na ação, os policiais serão denunciados. “Eu tô há quase 8 anos na instituição, e não tinha acontecido nenhum caso como esse, dessa gravidade“, relatou o promotor.
Familiares contestam duramente a versão da Polícia Militar. “Ele está como chefe do tráfico, e ele não é chefe do tráfico. Eu quero justiça, porque, se ele fosse chefe do tráfico, a gente vivia bem. Meu filho, ele significava tudo, que era um filho bom. Eu não tenho vida mais, eu não sinto vontade de viver. Somos bandidos para eles, e é depois que eles mataram os meninos que ficou pior”, afirmou a mãe de uma das vítimas.
O secretário de Segurança Pública da Paraíba, Jean Nunes, defendeu a ação da PM, dizendo que os policiais foram “recebidos a bala” e “agiram no estrito cumprimento do dever legal”. O comandante-geral da PM, coronel Sérgio Fonseca, afirmou que acredita que o jovem Gabriel Cassiano, motivado pela morte da mãe, “provavelmente deve ter atirado”.
“Eu não tenho procuração para defender os policiais, mas acredito, pela minha experiência, que esse jovem, que teve a mãe assassinada pela manhã, que saiu para se vingar, quando retorna e se depara com as guarnições, provavelmente deve ter atirado nas viaturas da polícia. Se alguém atira na Polícia Militar, ela vai revidar, não tem jeito”, disse Sérgio Fonseca.
A investigação do caso ainda passa por questões burocráticas. Inicialmente, havia dúvida sobre se o caso ficaria com a comarca de João Pessoa ou Conde. Parecer do Ministério Público determinou que siga na comarca do Conde.
O advogado dos policiais, Luiz Pereira, também negou atos ilegais e alegou que havia provas de que as vítimas planejavam um ataque para vingar a morte da mãe de um deles, com áudios circulando em aplicativos de mensagens. Disse ainda que houve resistência à prisão, e os policiais reagiram. “As vítimas estavam num contexto de criminalidade.”
As armas supostamente usadas pelos jovens foram apreendidas, e os corpos, levados pelas viaturas da PM ao hospital, onde já chegaram sem vida.