A cantora, compositora e instrumentista paraibana Madu Ayá acaba de alcançar mais um marco em sua trajetória artística: sua canção “Pedaços” foi classificada para o Festival Nacional da Canção 2025 (FENAC), considerado o maior festival de música do Brasil. Madu é a única artista da Paraíba entre os selecionados este ano.
A música escolhida propõe um caminho feito de fragmentos. Não há uma linha do tempo definida, mas cenas que surgem como flashes: pegadas no quarto, um fio de cabelo, uma voz no cobertor.
“Essa música nasceu como nascem as lembranças: aos pedaços. Não é sobre uma história só, é sobre tudo que ficou marcado no corpo, na alma e no tempo”, diz Madu.
A composição mistura sentimentos, objetos, presenças e ausências. Cada verso aponta para um detalhe do cotidiano que ganhou outro peso com o passar do tempo. A escuta proposta é intuitiva, aberta a múltiplas leituras.
“Tem gente que tenta entender a música pela lógica. Mas ‘Pedaços’ é emoção crua. São memórias que vêm como cheiro, toque, imagem. E tudo isso é poesia também”, explica.
Essa não é a primeira vez que Madu participa do FENAC. Em 2018, ela chegou à semifinal com a música “Me Tira D’eu”. Desde então, lançou novos trabalhos, se apresentou em festivais e trios elétricos, assinou projetos ligados à cultura popular e ampliou o alcance de suas músicas pelas plataformas digitais.
“Estar no FENAC com essa canção é um sinal de que há espaço para diferentes formas de sentir e cantar o mundo. Fico feliz por representar a Paraíba com uma música tão íntima”, afirma.
Com “Pedaços”, Madu leva para o palco do festival uma música construída por detalhes. Nada está exatamente inteiro. Mas tudo fala — e continua pulsando.
O festival – Criado em 1971, o Festival Nacional da Canção realiza etapas em cidades mineiras e é um dos espaços mais relevantes para a música autoral no Brasil. A nova edição reúne artistas de diversas regiões e estilos.
Pedaços
Eu vi pegadas no meu quarto de manhã
Achei um fio de cabelo enrolado
Numa presilha no bolso do meu casaco
Eu não sabia o que era então amar
Não vejo ondas do teu mar para pular
Eu lembro a voz tão rouca no meu cobertor
Lembro o roçar de pés dizendo que onde eu fosse
Eu levaria uma lua no olhar
Eu vi estrelas no teto daquela boca
E uma dança que eu não sei pronunciar
São tantas farpas e um monte de falas loucas
No colorir do céu a me relampear
Já escrevi na minha pele as tuas mãos
Eu tenho cartas queimadas por esse ar
Fico tentando fazer parar de pulsar
As tantas vezes em que o ‘sim ‘ me disse ‘não’
Deixei meus versos tateando o teu pescoço
Fingi que eu nunca choraria por amor
Se existe um Deus ele viu cantar de dor
Se existem vários se esconderam pra não ver
Vi sangue puro escorrer pelos meus braços
E uma serpente bambeando um bambolê
Na minha perna já senti capim comer
Ao som que os gatos fizeram no meu telhado
Já fiz o amor de fato acontecer
Um ferro quente engomou meu coração
Foi tanta brasa de abraço incendiado
Caiu em mim faísca de um amor passado
Que de pé junto eu falei que nunca mais
Já disse que nunca faria um juramento
Depois jurei por tudo que é mais sagrado
Que eu não teria abstinência de carinho
E de repente me deitei em um espinho
Já fiz o amor em mim acontecer
Eu vi estrelas no teto daquela boca
E uma dança que eu não sei pronunciar
São tantas farpas e um monte de falas loucas
No colorir do céu a me relampear