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Mais de 30 expressões religiosas se unem pela diversidade e contra a intolerância na Paraíba
23/08/2022 / 06:34
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Em Cajazeiras, no Alto Sertão paraibano, um pároco e seu grupo de fiéis realizavam uma procissão pelas ruas da cidade quando foram surpreendidos por fundamentalistas proferindo insultos, taxando o ritual católico de “diabólico” e afirmando que os cristãos não deveriam estar celebrando santos.

O caso é apenas um entre os vários registrados pelo Fórum Diversidade Religiosa Paraíba. Nos últimos nove anos, segundo dados coletados pelo grupo, o estado sofreu um aumento de 600% nos casos de intolerância religiosa, crime previsto em lei pelo Código Penal.

Saulo Gimenez, coordenador do fórum, ressalta que a maioria dos crimes – cerca de 90% – são praticados contra religiões de matriz africana, mas chama atenção para religiões minoritárias que são invisibilizadas, como expressões orientais, o budismo e a bruxaria.

“Você tem a invisibilidade das religiões de cunho pagão como a bruxaria, em que o praticante não pode dizer que é praticante porque senão pode ser assassinado, perder o emprego, sofrer algum abuso”, lamenta o coordenador. “A discussão é necessária pra mostrar que esses crimes existem, eles são hediondos, são crimes que ferem muito mais que fisicamente, mas deixam uma marca dentro dessas pessoas”, acrescenta.

Criado em 2013 com o objetivo de articular políticas públicas voltadas à coexistência pacífica entre todas as religiões e crenças – ou mesmo a ausência delas – o fórum defende a manutenção do Estado laico de direito, o ensino religioso plural e o combate ao racismo religioso.

“Os atos de intolerância vão desde o vilipêndio ao lugar sagrado de culto, à liberdade de culto, até mesmo uma agressão em que o chefe humilha o empregado por conta da sua religião. Tem agressão física como pedrada, uma tentativa como nós vimos em Campina Grande com coquetel molotov em cima de um terreiro. O vilipêndio a objetos sagrados, usar símbolos sagrados de outra pessoa de forma depreciativa, então são vários tipos possíveis de situações”, explica Gimenez, sacerdote Wicca e integrante do Coven Bruxo Sons Of Old Forest, da Hex Associação de Covens Bruxos e Neófitos do Brasil e da União Wicca do Brasil.

Além das subnotificações, o registro dos casos é feito com base nos dados da Secretaria de Estado da Segurança e Defesa Social, Disque 100, Observatório de Intolerâncias da Defensoria Pública do Estado da Paraíba (DPE-PB), Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da OAB-PB e Delegacia Especializada de Crimes Homofóbicos, Raciais e de Intolerância Religiosa de João Pessoa.

“O que a gente mais encontra são movimentos que não tem uma visão de que o diverso deva ser respeitado, e quando a gente fala diverso é o posicionamento político, filosófico, o dogma, o tabu religioso, a filosofia de vida. Então a gente precisa entender as peculiaridades dessa diversidade pra que haja o real respeito”, afirma Saulo Gimenez.

Museu e Biblioteca da liberdade religiosa

Composta por representantes de 35 expressões religiosas e instituições, o fórum atua recebendo, encaminhando e acompanhando as denúncias e processos, coletando dados, promovendo articulações junto às instituições, eventos, produção acadêmica e mobilizando o debate público.

O coordenador revela ainda o projeto de um museu e uma biblioteca que ampliem a discussão e conhecimento sobre diversidade e liberdade religiosa no estado.

Entre as vitórias conquistadas nos últimos nove anos de atuação, Saulo destaca a criação da Delegacia Especializada de Crimes Homofóbicos, Raciais e de Intolerância Religiosa (DECHRADI), o resgate da festa de Iemanjá de Cabedelo e a construção da Semana Municipal de Combate à Intolerância Religiosa, instituída por lei em João Pessoa, Cabedelo, Campina Grande e Puxinanã.

Na quinta-feira (18), mais de 40 expressões e instituições religiosas se uniram em evento alusivo à Semana Municipal, realizada na sede da Defensoria Pública do Estado (DPE-PB), em João Pessoa. O órgão conta com uma defensora pública designada especificamente para o atendimento de casos desse tipo, Lycia Pereira do Nascimento.

Além da DPE, vítimas de intolerância e racismo religioso podem procurar a DECHRADI, que tem como titular o delegado Marcelo Falcone.

Coordenador do Fórum Diversidade Religiosa Paraíba, Saulo Gimenez

Audiência pública na Assembleia Legislativa

No último mês de junho, 32 representantes do fórum em todo o estado – bruxos, ialorixás, babalorixás, pastores, seminaristas, espíritas, monges budistas, padres, juremeiros, representantes do Islam, caciques, entre outros – participaram de um encontro na Assembleia Legislativa da Paraíba (ALPB).

Durante reunião com o presidente da Casa, Adriano Galdino, os líderes fizeram a apresentação da Carta pela Liberdade e Diversidade Religiosa na Paraíba, manifesto que traz propostas contra as diversas formas de preconceito e discriminação.

Coordenador do Fórum Diversidade Religiosa PB, Saulo Gimenez se reúne com o presidente da ALPB, Adriano Galdino

Na ocasião, o movimento solicitou a realização de uma audiência pública sobre a temática na ALPB, reunindo autoridades, entidades, grupos, comunidades, lideranças e expressões religiosas do estado, bem como ateus, pessoas agnósticas e instituições que compõe o fórum. O pedido foi recebido pelo presidente Adriano Galdino e protocolado através do deputado Raniery Paulino, que se comprometeram em marcar uma data para a audiência.

“Cabe a gente cobrar dos entes públicos leis mais rigorosas, instituições dentro dessas demandas que possam tá fazendo um controle, um combate mais apurado, porque a sociedade civil organizada por si só é limitada, mas o Estado não, ele tem o dever de fazer com que haja diminuição, combate. Claro, ajudado sempre pelas expressões e movimentos”, reflete Saulo.