Autor de dois pedidos de vista que prolongaram a análise da Eletrobrás no Tribunal de Contas da União (TCU), o ministro Vital do Rêgo é pivô de um novo atraso na agenda de privatizações do governo Jair Bolsonaro. Vital contrariou a da área técnica do tribunal e colocou empecilhos à publicação do edital definitivo de venda da CBTU Minas, que prevê investimentos de quase R$ 3,5 bilhões na modernização da linha 1 e na implantação da linha 2 do metrô de Belo Horizonte. Ele é o relator do processo no órgão.
O relatório técnico da Secretaria de Infraestrutura Urbana do TCU, obtido pelo Valor, ficou pronto no dia 23 de junho e propunha uma série de ajustes pontuais — como correções nos custos projetados para a compra de material rodante (vagões), elevadores e escadas rolantes. Os auditores fecharam a análise, no entanto, com a seguinte conclusão: “Não foram constatadas irregularidades ou impropriedades que desaconselhem o regular prosseguimento do referido processo de desestatização”.
O processo subiu, então, para o gabinete de Vital. A expectativa do governo era que ele incluísse a pauta para deliberação no plenário do tribunal ao longo do mês de julho. Na semana passada, porém, o ministro assinou um despacho com dezenas de questionamento ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ao Programa de Parcerias e Investimentos (PPI), à MRS Logística (concessionária de ferrovias de carga que usa parte da malha) e à própria Companhia Brasileira de Trens Urbanos.
Ao todo, Vital fez mais de 50 pedidos adicionais de informação. Os ministérios da Economia e do Desenvolvimento Regional, responsáveis pela privatização, ficaram surpresos com a iniciativa e acreditam que isso deverá atrasar em pelo menos um mês o encaminhamento do processo ao plenário do TCU. O governo corre contra o tempo para fazer o leilão até dezembro, quando termina o mandato de Bolsonaro.
Trata-se de uma das últimas esperanças de privatização na lista dos auxiliares de Paulo Guedes, já que as vendas de outras duas estatais — Autoridade Portuária de Santos (SPA) e CBTU Recife — “escorregaram” para 2023 e agora dependem do próximo governo.
A empresa de trens urbanos administra as redes de passageiros em cinco capitais: Belo Horizonte, Recife, Natal, João Pessoa e Maceió. Ela é altamente deficitária. Para bancar o prejuízo operacional, precisou de R$ 5,5 bilhões em subsídios do Tesouro Nacional no quinquênio 2017-2021
A solução encontrada pelo governo foi “fatiar” as operações e privatizar as menos problemáticas financeiramente, começando pela CBTU Minas. Mesmo assim, o metrô de Belo Horizonte roda no vermelho. O BNDES desenhou, então, um modelo pouco comum. A União está colocando R$ 2,8 bilhões — já aprovados pelo Congresso em projeto de lei complementar — de imediato, o governo Romeu Zema (MG) se comprometeu com outros
R$ 428 milhões e o futuro operador terá que injetar mais R$ 227 milhões. A ideia é que, sob gestão privada, a operação será mais eficiente e poderá virar lucrativa.
A espinha dorsal do projeto é ampliar o número de passageiros mediante a construção da linha 2 (Nova Suíça-Barreiro), que deverá entrar em funcionamento em 2027 e terá sete estações. A linha 1 (Eldorado-Vilarinho), com 28 quilômetros de extensão, será modernizada e ampliada — ganhará mais uma estação em 2025.
Há duas semanas, o Valor mostrou que um impasse entre Ministério da Economia e governo do Rio Grande do Sul travou a privatização da Trensurb, estatal que opera os trens de passageiros na região metropolitana de Porto Alegre. A União propôs um aporte de R$ 1 bilhão, mas os gaúchos discordaram das premissas utilizadas nos estudos de viabilidade e isso inviabilizou a privatização.
A CBTU é oriunda da extinta Rede Ferroviária Federal (RFFSA), privatizada em malhas regionais na década de 1990. O governo federal continua cuidando das operações.
Porém, a Constituição de 1988 e a Lei Nacional de Mobilidade Urbana de 2012 definem que essa é uma competência dos Estados. Por isso, a modelagem da CBTU Minas prevê a estadualização dos serviços, que serão concedidos por 30 anos, além de alienação das ações da União à empresa privada vencedora da concorrência.