Uma ação de reintegração de posse acontece nesta sexta-feira (24.03) em uma área onde serão construídos hotéis do Polo Turístico Cabo Branco, nas imediações de Jacarapé. A ação, realizada após ordem judicial da Primeira Vara Cível de João Pessoa, é cumprida por policiais militares, civis, bombeiros e representantes de órgãos estaduais e municipais.
Na área, segundo autoridades que participam da operação, foram construídas residências, algumas de alto padrão, além de empreendimentos comerciais sem licenciamento ambiental, alvará de construção ou funcionamento.
De acordo com a equipe da Gerência Executiva dos Direitos Humanos da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano (Gedh-Sedh/PB), que realizou uma visita in loco, quinze casas possuem padrão mediano e dentre os que as construíram estão dois servidores públicos federais. Alguns teriam a pretensão de transformar as construções em pousadas. A equipe da Sedh afirma ter encontrado apenas uma família em situação de vulnerabilidade e risco social, que receberá assistência do governo do estado.
Parecer técnico realizado pelo Departamento de Engenharia Ambiental da Companhia de Desenvolvimento da Paraíba (Cinep) aponta que, após a ampla divulgação na mídia da retomada do projeto e a assinatura dos contratos referentes ao Polo Turístico Cabo Branco, o número de construções aumentou, totalizando 16 novas invasões a partir de março de 2020 até hoje. As construções irregulares causaram degradações ambientais dos lotes e alteração do projeto aprovado no entorno da Unidade de Conservação de Proteção Integral Parque das Trilhas, também pertencente ao projeto do Polo Turístico Cabo Branco.
“Importante destacar que, conforme todos os relatórios técnicos produzidos, não se trata de pessoas em condições de vulnerabilidade econômica e/ou social, em sua grande maioria. Ademais, estava-se supostamente ocorrendo exploração de atividade econômica e comercial na área, que é, inclusive, legalmente declarada de interesse público e afetada patrimonialmente, também por lei, ao projeto do Polo Turístico Cabo Branco”, afirmou o diretor presidente da Cinep, Rômulo Polari.
Apesar de a operação realizada hoje ser direcionada contra empresários que invadiram áreas para construção de casas, incluindo primeiro andar e piscina, fabricação e depósito de artefatos para construção civil, estufa para plantas ornamentais e até um camping, as ações de reintegração de posse também nos fazem lembrar da problemática social que envolve o déficit habitacional nas cidades, quando famílias em condições de vulnerabilidade não contam com moradia e acabam se abrigando em zonas consideradas precárias.
Assegurado pela Constituição Federal de 1988, o direito à moradia é uma competência comum da União, dos estados e dos municípios. A eles, conforme aponta o texto constitucional, cabe “promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico”.
Na Paraíba, cerca de 11.264 mil famílias ocupam, de forma irregular, espaços públicos e privados e estão com risco de despejo. Os dados são de dezembro de 2022, levantados pela organização Habitat/ ONU. Desse total, 7.764 famílias estão localizadas em João Pessoa. São pessoas que buscam moradias e encontram brechas onde possam instalar seu referencial de vida.
O problema envolve questões sociais, de saúde pública, econômicas e ambientais, ocasionando problemas à saúde e às despesas do orçamento público, consequentemente rateio do prejuízo para toda a sociedade. Em 40 anos, João Pessoa subiu de 3 para 111 o número de áreas consideradas favelas.
O problema das invasões é secular, no entanto, quem comete esse tipo de ato está sujeito a severa punição conforme Lei Federal nº 4.947, no art. 20, que estabelece que invadir terras da União, dos Estados e dos Municípios, com intenção de ocupação, é crime e está sujeito a detenção de 6 meses a 3 anos.
“A urbanização deficiente dos aglomerados subnormais, aliada a falta de conscientização ambiental da população e de educação sanitária e higiene, são responsáveis pela ocorrência de pelo menos dois grupos principais de riscos. O primeiro epidemiológico e sanitário, decorrentes das condições do habitat, da insuficiência de atendimento por parte da saúde pública e da precariedade da infraestrutura de serviços básicos. E depois os riscos ambientais ‘naturais’ induzidos pela ação humana”, defende a geocientista Maria Auxiliadora Clemente, em sua dissertação de mestrado em gestão e políticas ambientais da Universidade Federal de Pernambuco.