
A falta de recursos internacionais vem provocando o momento mais crítico já vivido por organizações que atendem refugiados no Brasil. Entre elas, a Cáritas-RJ, referência nacional no acolhimento de migrantes, enfrenta em 2026 a ameaça real de interromper suas atividades após os cortes anunciados pelos Estados Unidos na área humanitária durante o governo Donald Trump.
Aline Thuller, coordenadora do Programa de Atendimento a Refugiados e integrante da entidade há 18 anos, descreve um cenário inédito. Ela afirma que a instituição nunca passou por algo semelhante e revela que está sem salário devido ao bloqueio dos financiamentos. Com quase 50 anos de atuação e mais de quatro décadas de apoio financeiro do Acnur, a Cáritas agora calcula até a possibilidade de fechamento.
Os repasses que estavam previstos para 2025 tinham sido acertados no ano anterior, mas, em fevereiro, a organização foi avisada de que os cortes seriam antecipados por causa da revisão orçamentária adotada pelo governo Trump. A mudança obrigou a Cáritas a suspender o auxílio de subsistência destinado a imigrantes recém-chegados, verba usada para alimentação, cuidados médicos emergenciais e apoio com moradia. O início do curso gratuito de português foi adiado e parte da equipe precisou ser desligada.
O impacto também atingiu o próprio Acnur. Pablo Mattos, oficial de Relações Governamentais da agência no Brasil, explica que o orçamento global do órgão foi reduzido em quase 25%, resultado tanto da decisão norte-americana quanto de cortes feitos por países europeus. Pela primeira vez em uma década, a agência opera com menos de 4 bilhões de dólares, mesmo diante de um cenário de deslocamentos forçados que dobrou e alcançou 120 milhões de pessoas no mundo.
Com menos recursos, o Acnur iniciou a redução de pessoal no Brasil, incluindo áreas estratégicas como Roraima, e estima que cerca de 270 mil pessoas deixarão de receber apoio. A Cáritas lembra que apenas em 2025 prestou atendimento a refugiados de 78 nacionalidades e alerta para o risco de paralisação justamente quando há o maior fluxo global de deslocamentos já registrado.
Para Aline Thuller, a crise não é apenas financeira, mas também de responsabilidade. O Acnur classifica os efeitos das reduções como devastadores. Pablo Mattos define o impacto como considerável e bastante negativo, avaliação que resume o atual momento de retração humanitária.