GIULIANA MIRANDA
LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – Um evento em Portugal nesta terça-feira (1º) inaugurou um cabo submarino de fibra ótica que promete uma conexão de alta velocidade entre o Brasil e a Europa -um investimento de mais de 150 milhões de euros (cerca de R$ 1 bilhão).
A ligação direta entre o Brasil e o continente europeu tem como vantagem a redução da chamada latência -o tempo entre a solicitação de um comando e sua execução. Há uma redução de 50% em relação à rota atual, em que os dados passam primeiro pelos EUA para só então chegarem à Europa.
Isso significa um ganho de 60 milissegundos. Parece pouco, mas representa um salto para transações financeiras, transmissão de cirurgias remotas e até para o desempenho de jogos online.
A ligação entre a América do Sul e a Europa, sem passar pelos Estados Unidos, também era um antigo desejo de setores europeus mais preocupados com a privacidade de dados. Isso porque as leis europeias sobre armazenamento e compartilhamento de informações são bem mais restritivas do que as americanas.
“A nossa posição geográfica fez de nós no passado, faz de nós hoje e fará de nós, no futuro, a porta de entrada, uma ponte entre a Europa e outros continentes”, afirmou o primeiro-ministro português, António Costa (Partido Socialista), destacando a importância estratégica de seu país, que ocupa a presidência rotativa da União Europeia.
O ministro da Economia português, Pedro Siza Vieira, destacou as oportunidades de cooperação científica, empresarial e tecnológica entre a América do Sul e a Europa.
A inauguração foi inserida numa programação mais ampla sobre a liderança digital europeia, que teve também a participação, por mensagem em vídeo, do secretário-geral da ONU, António Guterres, e da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
O ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marcos Pontes, representou o Brasil na cerimônia.
Batizado de Ellalink (mesmo nome da empresa que o construiu), o cabo submarino se estende por 6.000 quilômetros, saindo de Fortaleza e chegando até Sines, no litoral português (160 km de Lisboa).
Idealizado há quase uma década, o projeto começou a ser construído em 2018. O cabo foi projetado para ter uma vida útil de 25 anos, segundo o CEO da EllaLink, Philippe Dumont, que chamou a obra de “uma grande aventura humana”.
A maior parte dos 150 milhões de euros da construção vem de investimento privado, embora haja um significativo aporte de dinheiro público. Cerca de 25 milhões de euros são financiados pelos chamados clientes-âncora do projeto, que investiram ainda antes de ele começar a sair do papel.
Entre eles está o consórcio científico Bella (Building Europe Link to Latin America) da qual fazem parte a rede de pesquisa Géant, do lado europeu, e a RedeCLARA, América Latina.
A RPN (Rede Nacional de Pesquisa), ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia do Brasil, aportou 7,5 milhões de euros pela Rede CLARA. As outras instituições de pesquisas latino-americanas da rede estão bancando os cabos que vão ligar os países da América Latina até Fortaleza.
Falando no evento de inauguração do cabo entre a Europa e o Brasil, o CEO da EllaLink disse apostar no rápido desenvolvimento da cidade de Sines, ancorado no investimento de empresas interessadas em aproveitar a nova ligação transatlântica.
De fato, nos últimos meses, Sines tem estado no centro de uma espécie de corrida por seus recursos tecnológicos. Em abril, foi anunciado que a cidade receberá um grande centro de dados internacional.
Com investimento de cerca de 3,5 bilhões de euros (R$ 22,1 bilhões), o projeto é o maior anunciado em Portugal em mais de uma década.
Até 2025, está prevista a criação de cerca de 1.500 empregos diretos e mais 8.000 indiretos na região.
Com a intensificação das transações online e a digitalização dos serviços, a demanda por ligações de fibra ótica de alta capacidade também disparou. A construção e operação dessas conexões é alvo de disputa de gigantes da tecnologia, com papel de destaque para o Google, e também está sujeito a desafios geopolíticos.
As iniciativas da China, por exemplo, são vistas com desconfiança por Washington e por muitos países europeus. O gigante asiático anunciou que pretende construir a “Rota da Seda Digital”, com uma extensa rede de fibra ótica entre os países participantes.
No mês passado, o Brasil aderiu a outra iniciativa de cabo submarino: o Humboldt, orçado em cerca de 400 milhões de dólares (cerca de R$ 2 bilhões). Capitaneado pelo Chile, o projeto pretende ligar a América do Sul, a Ásia e a Oceania.