João Pessoa 30.13ºC
Campina Grande 29.9ºC
Patos 30.99ºC
IBOVESPA 126526.27
Euro 5.4702
Dólar 5.1151
Peso 0.0059
Yuan 0.706
Preparação para a comunicação, muito além do media training – Parte II
22/08/2023 / 10:54
Compartilhe:

Neste artigo vou falar de técnicas que os líderes precisam dominar para se comunicar bem.

Sustento a tese de que, na atualidade, não basta fazer media training para saber como funciona a imprensa, aprender a se comportar de maneira correta em uma entrevista ou se relacionar adequadamente com jornalistas. É preciso capacitar os líderes para a comunicação de uma maneira muito mais ampla e intensa.

Comunicar bem é falar a verdade (ou o que com ela se parece) de forma simples e direta, da maneira mais sincera possível.

Comunicar de forma eficiente é dizer claramente o que o público-alvo vai ganhar. Apresentar rapidamente a solução para o problema. Mostrar o que pode mudar ou melhorar na vida das pessoas.

No tempo dos vídeos curtos, do WhatsApp, do TikTok, do YouTube, do Instagram, comunicar bem é ter a capacidade de fisgar o mais rapidamente possível a atenção do expectador/internauta. É não enrolar, não fazer arrudeios, como se diz no Nordeste.                          Dizem os americanos: get to the point!

Segundo Roger Ailes, no livro You Are the Message – Secrets of the Máster Communicators, começamos a nos decidir sobre outras pessoas sete segundos depois de conhecê-las. Estamos nos comunicando com nossos olhos, rostos, corpos e atitudes. As primeiras impressões são decisivas para a formação de imagem que temos de alguém, se simpatizamos ou se antipatizamos com aquela pessoa.

Este desafio se intensifica com a nova velocidade estabelecida pelas redes sociais, das múltiplas telas, do omnichannel e da convergência. Se o conteúdo não engajar nos primeiros segundos, o sujeito (especialmente os mais jovens) perde o interesse e muda.

A nova comunicação precisa ser mais surpreendente. Ninguém gosta de saber previamente o final do filme ou adivinhar como a piada termina. A comunicação monótona e entediante hoje cobra um preço muito mais alto do que no passado. Tudo acelerou, é necessário seguir o ritmo!

Por conta desta necessidade de rapidez e instantaneidade, o líder precisa ter muito claro na sua cabeça qual é o aspecto mais importante a ser comunicado – a mensagem-chave. E repetir a essência (a base do posicionamento) para fixar e enfatizar o ponto central a ser comunicado. Para separar o que é central do periférico, o líder precisa saber qual é o seu objetivo ao se comunicar e se preocupar sempre com o efeito desejado que a mensagem precisa causar no público.

O processamento da comunicação é mecanismo fundamentalmente baseado nas emoções e organizado através de atalhos cognitivos e informacionais. O cérebro humano é programado para simplificar e resumir tudo para poupar energia. Na comunicação é assim também. As descobertas da Neurociência a as Ciências Cognitivas comprovaram de forma cabal estas afirmativas.

O foco da comunicação deve estar, portanto, nas emoções do receptor da mensagem. Comunicação não é o que a gente fala, mas o que o outro entende e sente. A mensagem passada não é necessariamente a mesma que é recebida. Portanto, conhecer o que emociona o público–alvo e tentar tocar neste ponto é um dos segredos da boa comunicação. E pesquisar se a mensagem que se queria transmitir foi realmente interpretada da forma pretendida pelo emissor pelo público.

Aqui eu abro um parêntese para contar uma história. De 2004 a 2008, a TV Cultura de São Paulo produziu a Campanha Vota Brasil para o Justiça Eleitoral. Eu era contratado para prestar consultoria na orientação e no planejamento desta campanha. No ano de 2006 o conceito definido para a campanha foi: “O Brasil é tão bom quanto o seu voto”. Haviam vários filmes dizendo que o eleitor é o patão, que os políticos eleitos são funcionários (representantes) do povo. E na sequência, o conceito se desmembrava para os cargos em disputa: “o seu presidente é tão bom quanto o seu voto, o seu governador é tão bom quanto o seu voto, o seu senador, o seu deputado…” As primeiras peças foram veiculadas e no dia seguinte dois grandes jornais soltam matérias dizendo que a campanha do Tribunal Superior Eleitoral poderia favorecer a reeleição dos atuais mandatários. Me lembro que o meu telefone tocou com um pedido para fazermos imediatamente uma pesquisa qualitativa, com grupos focais, para confirmar ou desmentir a tese de que o mote da campanha induzia o voto a favor da reeleição dos incumbentes. Durante a pesquisa, quando se perguntava para as pessoas quem elas achavam que eram os “governadores, os senadores… tão bons quanto o seu voto” elas achavam que eram os que estava exercendo o atual mandato. Portanto, a pesquisa concluiu que a campanha induzia mesmo à reeleição e foi imediatamente retirada do ar, salvando-se apenas o slogan genérico “O Brasil é tão bom quanto o seu voto”. A partir daí todas as campanhas do TSE passaram a ser previamente testadas antes de serem veiculadas. Esse episódio confirma que – comunicação não é o que a gente fala, mas o que o outro entende.

Voltemos ao ponto – como se comunicar de forma eficiente?

A comunicação precisa ser sobretudo empática. O líder deve se colocar no lugar do outro e dialogar com suas expectativas, desejos, necessidades, sentimentos e emoções. Ao mesmo tempo, para transmitir uma mensagem ao outro, é preciso entender o que há para ser comunicado dentro de nós mesmos. O bom comunicador é aquele que é capaz de promover um diálogo, ou uma troca, entre as percepções pré-existentes da plateia (transfusão) e os seus próprios sentimentos e emoções. Com isso consegue gerar identidade, conexão e empatia.

A boa comunicação convida o receptor a participar da trama ou da narrativa. Para isso é interessante usar as metáforas, a linguagem por excelência das emoções e do inconsciente. Um bom comunicador sabe construir imagens na mente do público, dar exemplos concretos, detalhar o que está falando, para o receptor conseguir imaginar o contexto da fala. Ou seja, um bom comunicador é, sobretudo, um bom contador de histórias, criador de narrativas envolventes e imaginativas.

Contudo, desde Aristóteles, em Arte Retórica e Arte Poética, já sabemos que o maior impacto do que é comunicado está na maneira como a pessoa diz e não no conteúdo do que é dito. Para o filósofo grego, a persuasão do público depende de argumentos ou provas. Entre as provas fornecidas pelo discurso, Aristóteles distingue três espécies: primeiro, o caráter moral do orador. Para se obter a persuasão através do efeito moral, o discurso deve ser pronunciado de modo a deixar a impressão de que o orador seja digno de confiança. Segundo, a disposição que cria na plateia. Obtém-se a persuasão dos ouvintes quando o discurso os leva a sentir uma paixão ou emoção. E terceiro, o orador, através do discurso, da força de sua oratória, deve ser capaz de convencer o público, demonstrando a verdade ou o que com ela pareça.

Quando se afirma que o maior impacto do que é comunicado está na maneira como a pessoa diz e não no conteúdo que é dito, está-se sobretudo destacando a dimensão não verbal da comunicação. Os gestos, olhar, postura, posição do corpo, expressões do rosto, vestimenta – constituem mais de 50% da mensagem e, somados à voz (entonação, ritmo, tom, timbre) e à cena (fundo/ruídos), presentam quase 90% da comunicação. As palavras pronunciadas, o conteúdo em si da fala, representam no máximo 10% do que é comunicado.

E ainda existe a dimensão das microexpressões, estudadas pelo psicólogo americano Paul Ekman, da Universidade da Califórnia, que foi pioneiro na pesquisa e sistematização da relação entre as emoções e as expressões faciais.

No livro A linguagem das Emoções, Ekman chamou de microexpressões a contrações inconscientes e involuntárias dos músculos faciais, que ocorrem em menos de meio segundo (por vezes 1/25 de segundo), e que revelam o que a pessoa sente, independente do que está verbalizando. Baseado nesta descoberta, Ekman comprovou a importância das microexpressões faciais na comunicação interpessoal e na avaliação da credibilidade do emissor da mensagem. O trabalho de Paul Ekman ficou conhecido do grande público a partir da série veiculada no streaming intitulada “Lie to Me” onde o ator Tim Roth protagoniza Cal Lightman, personagem diretamente inspirada na vida de Ekman.

Uma vez que o líder tenha domínio sobre a linguagem não-verbal e, eventualmente até mesmo das microexpressões, elas podem ser usadas para ampliar a sua capacidade de comunicação verbal e vice-versa. As duas formas de comunicação podem ser coerentes ou ser discordantes. Se o indivíduo verbaliza uma coisa e os seus movimentos expressam outra, a informação transmitida pela linguagem não-verbal prevalece. A comunicação não-verbal é reconhecida pelo inconsciente (abaixo do nível de consciência) e é lida pelo cérebro como sendo mais verdadeira.

Conclusão. Comunicar-se bem é uma das principais competências exigidas dos líderes eficientes. Dominar a comunicação verbal exige treino e condicionamento. Dominar a linguagem não-verbal e as microexpressões é tarefa ainda mais difícil. Mas é algo bastante desejável para líderes de alta performance.


* Rodrigo Mendes é publicitário, sociólogo e cientista político, estrategista de marketing e comunicação pública com 25 anos de experiência, já tendo coordenado 60 campanhas eleitorais e prestado consultoria para diversos governos, instituições e lideranças. Autor dos livros – MARKETING POLÍTICO: O PODER DA ESTRATÉGIA NAS COMPANHAS ELEITORAIS. OS SEGREDOS DA GESTÃO PÚBLICA EFICIENTE. MARKETING ELEITORAL: APRENDENDO COM CAMPANHAS MUNICIPAIS VITORIOSAS e NOVAS ESTRATÉGIAS ELEITORAIS PARA UM NOVO AMBIENTE POLÍTICO.