FERNANDA BRIGATTI
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O relaxamento das restrições e o avanço da vacinação contra a Covid-19 vão lentamente abrindo caminho para a volta aos escritórios.
Ainda que o home office tenha sido um privilégio de uma minoria –somente 11% dos ocupados brasileiros tiveram esse direito em 2020, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)–, foram 8,1 milhões de trabalhadores que tiveram de improvisar estações de trabalho e conciliar rotinas profissionais e pessoais enquanto seguiam suas jornadas a partir de suas casas.
Agora, com o pós-pandemia no horizonte, termos como flexibilidade e trabalho híbrido ganham espaço –e quem não quiser empregados descontentes terá de levar isso em consideração.
Segundo pesquisa da Ipsos sobre a volta aos escritórios, 66% dos trabalhadores acham que as empresas terão de ser flexíveis quanto a exigir a presença no local de trabalho, e 63% querem poder decidir quando ir ao não.
As preferências dos trabalhadores quanto a voltar ou não aos escritórios, porém, aparecem bem divididas. Quatro em dez disseram que preferem trabalhar totalmente fora de casa assim que a pandemia terminar. Na outra ponta, 31% querem trabalhar totalmente em casa.
“O dado mais óbvio da pesquisa é o de que a flexibilidade não tem volta”, diz o presidente da Ipsos no Brasil, Marcos Calliari. “O que é inesperado é que o Brasil apresenta números muitos parecidos nos extremos, entre os que absolutamente querem voltar e os que não querem”.
Para Calliari, os resultados dão uma dimensão do quão mais complexo ficará a gestão de pessoal.
Quando a Ipsos perguntou quantos dias os trabalhadores gostariam de cumprir jornada em casa, 30% optaram por todos os dias da semana, tendo em conta uma semana de cinco dias.
Os demais se dividiram entre preferir um (10%), dois (15%), três (18%) e quatro (7%) dias de home office ao fim das restrições.
“Vai ser complexo lidar com isso e entender a posição de cada funcionário. O grande achado não é mais se vai ser home office total ou parcial. As empresas vão precisar ter um modelo que respeite as peculiaridades individuais”, afirma.
Na avaliação de Calliari, fatores como a distância entre casa e local de trabalho e ter ou não filhos influenciam na posição do trabalhador quanto ao retorno à rotina no escritório. “Já não é somente sobre trabalhar em casa. [Para o futuro], é fazer uma reunião no escritório, mas poder buscar os filhos na escola.”
A pesquisa da Ipsos foi realizada com 12.445 trabalhadores de 16 a 74 anos em 29 países.
Entre os brasileiros, 65% disseram que se sentem mais produtivos com um cronograma flexível. Nas empresas em que já se discute um formato para o pós-pandemia, Calliari avalia que os modelos de retorno são, na prática, rigorosos. “São dois dias em casa, mas o que vemos é que as expectativas são mais complexas.”
O trabalho remoto no Brasil em 2020 foi bastante heterogêneo. Segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), a maioria das pessoas ocupadas e que ficaram trabalhando em casa no ano passado eram mulheres brancas e com nível superior completo.
O maior contingente de pessoas em home office estava em São Paulo. Eram 2,9 milhões em 2020, ou 35,5% do total. No outro extremo, apenas 16 mil pessoas estavam em trabalho remoto no Amapá, 14 mil no Acre e 13 mil em Roraima.
Para Marcos Calliari, da Ipsos, há chance de as discussões sobre o futuro do trabalho remoto e a possibilidade de as empresas adaptarem seus funcionamentos às demandas de seus funcionários ficarem restritas às grandes empresas.
“As micro e pequenas, que são os maiores empregadores, não têm uma estrutura para endereçar essas questões. Além disso, a maioria já voltou às atividades.”
Nas grandes firmas, porém, ele nota que começa a existir uma preocupação com um aumento de rotatividade como consequência do trabalho remoto e de uma desmobilização de funcionários. Distante da equipe e de superiores, o desligamento fica mais fácil.
Por isso também, diz o executivo da Ipsos, empresas que chegaram a cogitar a adoção permanente do trabalho à distância recuaram da decisão ao avaliar que a retenção de talentos fica mais difícil sem o desenvolvimento do que os gestores chamam de “cultura da empresa” –seus hábitos, valores e rituais.
“Claramente há uma percepção de que há prejuízos se você nunca estiver no escritório. Perde-se convivência e engajamento”, afirma.
Uma outra pesquisa, essa conduzida pela Grant Thornton, diz que somente 7% das empresas brasileiras descartam manter o home office. A perspectiva de economizar com o custo de manutenção das instalações é atraente para os negócios.
Segundo a consultoria, 45% dos executivos consultados disseram estar “avaliando seriamente” a possibilidade de adotar o home office de maneira permanente. Foram ouvidos cerca de 5.000 empresários em 32 países.
A redução dos espaços vem estimulando outros tipos de negócios, como o dos coworkings –empresas que locam estações de trabalho para pessoas físicas e empresas.
Na WeWork, Lucas Mendes, diretor-geral da operação no Brasil, diz ter havido uma “explosão de procura” nos últimos três meses. E ainda que nem todo mundo feche negócio, ele afirma que os novos contratos dão à empresa perspectivas de voltam a crescer, depois de um 2020 de retração.
A empresa não abre números ou taxa de ocupação, mas Mendes diz que a vacância é muito baixa. O que atrai as firmas ao modelo da WeWork é justamente a flexibilidade. No lugar de um contrato de locação de cinco anos, elas podem locar mesas, estações de trabalho e salas de reunião até mesmo por diárias, mas há contratos de até um ano. Dispensam também custos com limpeza, copa ou segurança.