O assunto inteligência artificial (IA) não sai da pauta. Tem sido o centro das atenções em praticamente todos os fóruns de debates dos mais variados setores, já que permeia tudo e a todos, e assim continuará.
Não foi diferente no Web Summit 2023, que aconteceu semana passada no Rio de Janeiro, reunindo empresas e personalidades do mundo inteiro para discutir tendências e inovações e foi a primeira edição realizada no Brasil, com o intuito de impulsionar a inovação e o desenvolvimento tecnológico do país. Como proposto, a inteligência artificial foi um dos temas centrais, com debates sobre a utilização da IA em diversos campos, como marketing, comunicação, saúde, finanças e entretenimento.
O Web Summit 2023 Rio trouxe à tona uma série de reflexões sobre a inteligência artificial, porém, o debate foi dominado pelas preocupações sobre como lidar com as possíveis consequências negativas da IA. Sim, a inteligência artificial é fantástica e assustadora ao mesmo tempo. E não sou eu que estou dizendo, apenas corroboro o que grandes pensadores e até mesmo um dos pais da IA, Geoffrey Hinton, estão divulgando nos mais importantes veículos de comunicação do mundo, como a revista The Economist ou o The Wall Street Journal, para citar dois exemplos.
As questões éticas e sociais, como a substituição de trabalhadores por robôs e a falta de transparência em decisões tomadas por algoritmos também em substituição às decisões humanas são as grandes interrogações na cabeça de todos que estão minimamente informados sobre as possibilidades que a inteligência artificial proporciona.
Nesse sentido, o Web Summit 2023 bateu forte e repetidamente nas teclas ética e responsabilidade, sugerindo que haja uma abordagem colaborativa entre especialistas em tecnologia, organizações governamentais e da sociedade civil. De maneira geral, do ponto de vista ético, as lideranças que estiveram presentes no evento foram unânimes em defender a transparência, assim como o respeito à privacidade dos indivíduos, além de um olhar muito cuidadoso para evitar a discriminação baseada em raça, gênero, orientação sexual ou qualquer outra característica. No quesito responsabilidade, os impactos na economia e na sociedade, e como a IA pode se tornar uma ferramenta valiosa para ajudar a resolver desafios globais e melhorar a vida de todos, versus falta de capacitação e desemprego também estiveram no cerne do debate.
Ainda há muito a ser explorado e entendido em relação à IA. Além de eventos globais como o Web Summit como disse acima, acompanhar pensadores influentes pode nos ajudar na compreensão do cenário e impactos, e ainda como nos preparar para o que já está posto e pelo que ainda virá. Por isso, trago para nossa reflexão dominical as preocupações recém publicadas pelo o filósofo Yuval Noah Harari, autor de best-sellers como “Sapiens” e “Homo Deus”, também é conhecido por suas opiniões sobre o futuro da inteligência artificial e a possibilidade de mudanças significativas na sociedade.
Além das questões já colocadas acima – ética, responsabilidade, capacitação, inclusão, privacidade, autonomia – e que são unânimes nas discussões sobre IA, segundo Harari, é preciso criar um sistema que valorize não apenas a eficiência, mas também a criatividade, a empatia e outras habilidades humanas que não podem ser replicadas pela tecnologia.
Em seu último artigo publicado na revista The Economist, Harari vai além e faz um alerta muito contundente. O próprio título – “A IA ‘hackeou’ o sistema operacional da civilização humana” – já é uma advertência e vale, por isso mesmo, trazer aqui um trecho do artigo do filósofo: “O medo da inteligência artificial assombra a humanidade desde o início da era do computador. Até então, esses medos se concentravam em máquinas que usavam meios físicos para matar, escravizar ou substituir pessoas. Mas, nos últimos dois anos, surgiram novas ferramentas de IA que ameaçam a sobrevivência da civilização humana em uma direção inesperada. Inteligência artificial ganhou algumas habilidades notáveis para manipular e gerar linguagem, seja com palavras, sons ou imagens. IA invadiu o sistema operacional de nossa civilização.
A linguagem é o material de que quase toda a cultura humana é feita. Os direitos humanos, por exemplo, não estão inscritos em nosso DNA. Em vez disso, são artefatos culturais que criamos contando histórias e escrevendo leis. Deuses não são realidades físicas. Em vez disso, são artefatos culturais que criamos inventando mitos e escrevendo escrituras.”
Simplificando, Harari quer dizer que a IA está reescrevendo as regras do game vida, mudando, sem que a gente tenha plena percepção, a natureza da inteligência, superando a humana em muitas áreas. Além disso, está mudando a natureza do trabalho, a natureza da sociedade criando novas formas de poder e controle. Ele defende a criação de novos sistemas de governança para garantir que a IA seja usada de maneira ética e responsável. Tudo para ontem!!
E não é por acaso que um dos padrinhos da inteligência artificial, Geoffrey Hinton, anunciou recentemente sua saída do Google, onde trabalhou por mais de uma década. Hinton argumentou que queria se aposentar, mas todos sabem que ele preferiu estar fora do “sistema” para falar livremente dos perigos da tecnologia, principalmente o risco real à existência humana. O ex-Google teme que a tecnologia dissemine conteúdo falso por toda a internet, chegando a um ponto em que não seja mais possível para os usuários separar o que é verdade do que é mentira. Ele acredita que, no futuro, a IA possa ficar mais inteligente que os humanos e capaz de comandar ataques cibernéticos e disparar armas sozinha. Quem se lembra do personagem HAL 9000 do filme 2001: Uma Odisséia no Espaço?
É para ficar de cabelo em pé? Eu diria que mais ou menos. Mas o que não podemos nos permitir é ficar longe e fora dessa discussão que, como já disse nessa coluna um par de vezes, está moldando e moldará cada vez mais e em uma velocidade absurda a sociedade do agora e, principalmente, do futuro próximo.