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Diretor do Hospital Padre Zé desafia Teologia da Libertação e gera reações intensas entre progressistas
10/01/2024 / 16:20
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Durante a homilia realizada em 10 de dezembro na Comunidade Filhos da Misericórdia, fundada por ele, Padre George Batista provocou controvérsias ao classificar a Teologia da Libertação como “desgraça” e “demônio”.

O diretor do Hospital Padre Zé, que já foi parte desse movimento nos anos 90, destacou suas críticas, afirmando que a ideologia retira o Reino do centro e utiliza o pobre como mera bandeira ideológica, chegando a associar defensores a atos ilícitos como roubo de hospitais.

A Teologia da Libertação, corrente teológica cristã surgida na América Latina nos anos 60, enfatiza a libertação dos oprimidos, incorporando análises socioeconômicas e uma “opção preferencial pelos pobres”.

O posicionamento de Padre George desencadeou reações de católicos progressistas, que emitiram uma nota de desaprovação, enquanto o presidente do PT na Paraíba, Jackson Macêdo, expressou seu repúdio nas redes sociais, classificando as declarações do religioso como uma “aberração argumentativa”.


Confira a íntegra da nota emitida por representantes da igreja católica:

RESPOSTA AO PADRE GEORGE

Nos últimos dias circulou entre nós um vídeo do padre George da Arquidiocese da Paraíba, atualmente administrador do Hospital Padre Zé, onde numa homilia, condenou a Teologia da Libertação como a maior desgraça que aconteceu nos últimos cinquenta anos na Igreja.

Como a fala do padre atingiu os grandes luminares dessa corrente teológica que já se encontram na Casa do Pai e não podem se defender; aqui estamos para defender a memória desses insignes teólogos e pastores. O que esse padre fala contra esses teólogos e pastores é de uma leviandade monstruosa. Falar contra essa teologia sem os devidos fundamentos é próprio de uma pessoa que não procura os fundamentos para fazer um juízo de valor contra esse ou qualquer pensamento teológico. Como uma pessoa condena uma teologia que procura a liberação do pobre e ele mesmo administra um hospital que atende ao mais pobres? De antemão, queremos asseverar que esses ataques são vis e desonestos; próprio de quem se revela com cinismo e hipocrisia.

Queremos, inicialmente, fundamentar nossa resposta às críticas injustas e sem fundamento se apoiando na Sagrada Escritura.

No livro do Êxodo está escrito: “O senhor disse a Moisés: Eu ouvi o clamor de meu povo, por isso, desci para libertá-lo das mãos dos opressores.”

Quando nos referimos ao termo Teologia da libertação, estamos nos reportando à Bíblia que é a fonte da Teologia.


Nos últimos dias o padre George da Arquidiocese da Paraíba, da qual também fazemos parte, em um vídeo extremamente panfletário, ataca a Teologia da Libertação de forma desonesta e imprudente. Trata-se de uma pregação em que a hermenêutica enquanto sua ciência de interpretação está enviesada pelo véu da ignorância.

Assim sendo, a pregação não passa de uma mera opinião, isto é, daquilo que os gregos chamam de doxa. Mesmo com as limitações do vídeo, gostaríamos “a grosso modo” de precisar o conceito de libertação na Teologia e na tradição bíblica.

A categoria libertação não foi inventada pelos teólogos; como todos sabem a categoria libertação é um pré-requisito na elaboração da Teologia Bíblica. Destarte, é na América Latina que essa categoria vai ganhar cidadania teológica. O grito dos oprimidos ecoa desde o processo de colonização. A Campanha da Fraternidade de 1988 trouxe como tema: o grito do povo negro. (A Fraternidade e o Negro).

Hoje escutamos o grito da mulher oprimida pelo machismo; o grito dos irmãos e irmãs LGBTQIA+ frente a LGBTFobia; o grito da natureza que sofre com o desmatamento criminoso desse capitalismo predador.

Os corpos dos latino-americanos trazem as marcas dos vários processos colonizadores; de modo que o contexto atual se assemelha à condição de escravidão do Egito.

O Deus que ouviu o grito do povo no Egito é O Mesmo que hoje ouve o grito da terra e dos pobres.

O pensamento latino-americano da libertação se origina na práxis, isto é, enquanto discurso crítico e reflexivo sobre a práxis se configura como ato segundo.

Na perspectiva cristã, práxis é, antes de tudo, conversão. O filósofo Manfredo Araújo, assevera que o seguimento de Cristo determina o ser cristão. Fazer um novo caminho é a razão e o sentido de todo processo de conversão. Este novo caminho conduz ao outro; ao próximo; sobretudo, ao pobre. O pobre como possibilidade da reflexão teológica torna-se um Locus Theologicus.

A partir daqui os pobres e sua libertação constituem o lugar privilegiado no qual ganham centralidade nos temas filosóficos e teológicos.

A palavra libertação tem justamente a pretensão de exprimir uma nova consciência histórica; nova forma de compreensão da realidade, na qual foi interpretada, antes de tudo, como totalidade estruturada e contraditória em si mesma.

A Teologia da Libertação compreende que a situação da pobreza e miséria não são desejadas por Deus, mas é fruto da forma de organização da sociedade.

Queremos agora nos apegar à mera opinião do padre George na sua homilia. Inicialmente, é de deixar qualquer um estarrecido pela falta da referida teologia, por ele criticada, e pela falta de honestidade intelectual. Ele diz no vídeo que foi no período de formação de seminarista adepto dessa Teologia, inclusive leu todos os livros de Leonardo Boff.
Como uma pessoa que diz ter lido entre quarenta ou cinquenta livros de Boff, chega a fazer afirmações absurdas que carecem de um mínimo de fundamento?

O discurso do padre está recheado de uma ideologia própria do tradicionalismo inconsequente que impera hoje na Igreja. Uma fala que serve para dar sustentação à extrema direita católica. Chegar a afirmar que a TL tirou o Reino do centro para colocar o pobre. Agir dessa forma configura uma desonestidade. Se o padre, de fato, tivesse lido todos esses livros que ele diz ter lido, jamais faria uma afirmação dessa natureza. Infelizmente, o padre George, não consegue distinguir na Teologia o que é o elemento arquitetônico do elemento hermenêutico.

O padre chegar a afirmar que a TL é um demônio que entrou na Igreja para fazer mal.

O que dizer das novas comunidades?

São expressões de profecias ou de um estado psíquico doentio obsessivo?

Demoníaco é todo discurso que procura combater os que lutam por justiça social para os pobres.

Demoníaco é esse assistencialismo que gera dependência e não promove a vida das pessoas para que sejam independentes; infelizmente, o referido padre não aprendeu que a política é a melhor expressão da caridade, segundo Papa Pio XI.

O mais grave do discurso do padre George é afirmar que os seguidores dessa corrente teológica- pastoral usam os pobres para tirarem proveitos para si mesmos, como, por exemplo, roubar um hospital. A falta de seriedade aqui chega ao extremo; comparar os grandes luminares da TL com o padre Egídio que nunca pertenceu a essa corrente teológica é agir de forma leviana.

Com essa afirmação, o referido padre coloca em dúvida a vida de Dom Helder Câmara, Dom José Maria Pires, Dom Paulo Evaristo Arns, Dom Luciano Mendes de Almeida, entre outros.

Como o padre George tem um público fiel, com esse discurso procurou agradar a classe dominante quem sabe para receber as benesses para comunidade por ele fundada.

Toda pessoa sensata sabe o que acontece em muitas dessas comunidades novas. Os problemas se explicitam, mas nem por isso se viu alguém da Teologia da Libertação emitindo um juízo de valor de forma irresponsável. Poderíamos enumerar vários casos graves que aconteceram, mas não é necessário aqui, pois é de pleno conhecimento público.
Por último, queremos enfatizar que a Teologia da Libertação não pode ficar restrita a mera produção acadêmica; ela é a expressão de uma experiência de Igreja que fez da libertação do pobre, uma explicitação do conteúdo da revelação.
O sentido da liberdade só é verdadeiro enquanto se mostra como princípio e fim de todas as configurações que medeiam a vida humana.

No pensamento da libertação, a liberdade é assim concebida como síntese, ela é antes de tudo, transcendência, autonomia do eu sobre qualquer facticidade, inclusive, sobre si mesmo e suas ações.

Que o padre George aprenda da filosofia da linguagem: “sobre o que não se pode falar, deve-se calar.”

Pe. Gedeon José de Oliveira
Pe. Waldemir Cavalcante Santana
Pe. Luiz Antônio de Oliveira
Pe. Djaci Pereira Brasileiro
Pe. Glênio Guimarães Braga Costa
Diac. Josinaldo Dantas da Silva
Ir. Marinalda Ferreira Augusto
Ir. Josefa Maria da Conceição
Ir. Mariane dos Santos Andrade
Ir. Edilene Pereira da Silva
Maria Luíza Pereira Alencar Mayer Feitosa
Marco Aurélio Mayer Feitosa Ventura