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Meus mestres do marketing político brasileiro
07/08/2023 / 18:59
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A política e as eleições, desde a mais tenra idade, foram do meu interesse. Foi cedo mesmo.     Já na escola de primeiro grau, no Centro Pedagógico da UFMG(Universidade Federal de Minas Gerais), com pouco mais de 8 anos, era representante da minha classe. Lembro-meque gostava de assistir ao horário de propaganda política, que ainda era regulada pela Lei Falcão e, na verdade, era uma espécie de “santinho eletrônico”, com a foto e o currículo dos candidatos, sendo falado por um locutor em off.

No segundo grau, dos quatorze para os quinze anos, mudei para um outro colégio onde fui presidente do Grêmio. Em 1988, lideramos um movimento das escolas particulares contra o aumento das mensalidades. Fizemos grandes passeatas, mobilizamos milhares de estudantes   eparticipamos de audiências com os deputados na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Nesta época,ficava fascinado com os debates na TV. Recordo-me muito bem dos embates de Maluf com Antônio Ermínio de Morais, Suplicy, Quércia … um deleite.

Quando fui fazer faculdade de Ciências Sociais na UFMG, desde o início interessei-me pelo tema marketing político. E comecei a minha pesquisa. Eram poucos os autores que escreviam sobre o assunto e haviam poucos marqueteiros que se destacavam (desculpe-me meu finado amigo Carlos Manhanelli, que detestava que usássemos esta expressão –preferia consultor político ou marketólogo). Lembro que o primeiro livro que li foi Jogando para Ganhar, de Ney Figueiredo, um dos pioneiros na atividade, tio do meu amigo Rubens Figueiredo, também autor de vários livros sobre marketing político, essenciais na nossa área.Recordo ainda que inicialmente tive acesso aos livros de Manhanelli e do professor Gaudêncio Torquato.

Frequentava muito a ótima biblioteca da FAFICH (Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG) e,aos poucos, fui devorando livros e compondo uma vasta bibliografia sobre marketing político. Este estudo se transformou, primeiro no meu trabalho de conclusão de curso de Sociologia e, em versão mais completa, em minha dissertação de Mestrado em Ciência Política, também, na UFMG.

Na universidade segui a minha trajetória no movimento estudantil, disputando uma eleição e tornando-mepresidente do Centro de Estudos de Ciências Sociais, o CACS. Também me elegi presidente do grêmio do CPOR (Centro de Preparação dos Oficieis da Reserva). Nestas disputas confirmei minha verdadeira vocação – fazer campanhas eleitorais. Gostava mesmo era da disputa pelo poder, da eleição, da conquista; a gestão, o dia-a-dia da administração, não se revelava tão interessante.

Ainda na faculdade, em 1992, tive a oportunidade de conduzir minha primeira campanha eleitoral, de uma colega de minha mãe que foi candidata a vereadora em Belo Horizonte.             Foi muito bem votada, e mesmo não se elegendo, ficou nas primeiras suplências do partido.

Nesta época, comecei a acompanhar o trabalho dos profissionais que militavam na área do marketing político. Fui ao congresso da ABCOP (Associação Brasileira dos Consultores Políticos), se não me engano de 1994, e conheci Geraldo Walter, o Geraldão, que foi uma das minhas primeiras referências, com seu brilhante trabalho na campanha de Fernando Henrique Cardoso para presidente. Infelizmente o Geraldão nos deixou prematuramente.

Depois acompanhei o trabalho da agência Propeg, comandada pelo amigo Fernando Barros, que estava fazendo campanhas em Angola. Ricardo Carvalho e Nelson Biondi eram outros profissionais que também se destacavam. Foi quando ouvi falar de Duda Mendonça e de Chico Santa Rita.

Em 1996, abri, juntamente com meu pai e sócio José Américo Ribeiro, a Mendes Ribeiro Comunicação &Marketing (hoje RMR Consultoria de Inteligência) e realizamos em BH cinco seminários nacionais de marketing político. Levamos para a capital mineira diversos profissionais como Chico Santa Rita, Carlos Manhanelli, Rubens Figueiredo, Haroldo Cardoso, Sérgio Arapuã, Gaudêncio Torquato, dentre outros.

Em 1996, participei da campanha vitoriosa do médico Célio de Castro à prefeitura de Belo Horizonte (a quem assessorei na comunicação) e, em 1998, fiz a campanha do Cabo Júlio a deputado federal, que tinha sido líder do primeiro movimento grevista na Polícia Militar de Minas. Cabo Júlio foi o candidato mais votado naquela eleição,com 218.000 votos.

Em 2002, publiquei o meu primeiro livro, Marketing Político – o poder da estratégia nas campanhas eleitorais. Obra que busca entender quais são as referências teóricas e históricas do marketing político eque teve o seu prefácio escrito por Rubens Figueiredo e a sua contracapa assinada por Chico Santa Rita, uma grande honra para mim.

De lá para cá, trabalhei em 60 campanhas eleitorais e, se contarmos desde a campanha de 1992, já são mais de 30 anos de atividade no marketing político. Nunca parei de estudar e            aprofundar no tema, fazer palestras echeguei inclusive a ser professor em diversos cursos de pós-graduação em marketing político Brasil afora, incluindo a própria UFMG.

Contudo, sempre tive em Manhanelli, em Duda Mendonça e em Chico Santa Rita minhas grandes referências profissionais.

Carlos Manhanelli foi um dos fundadores e eterno presidente da ABCOP, entidade a que me filiei em 1994 e da qual fui diretor por algumas décadas. Sem a menor dúvida, Manhanelli foi um dos grandes responsáveis pela profissionalização da nossa atividade no Brasil. Professor e palestrante brilhante e um consultor experiente, muito articulado com os colegas e as associações internacionais. Seus livros sempre foram extremamente úteis para quem está na prática do marketing político. Quantas vezes não reli Marketing Eleitoral – o passo a passo do nascimento de um candidato para organizar as minhas campanhas. Na pandemia da Covid-19 Manhanelli não parou de viajar para suas atividades de consultoria e a doença acabou por levá-lo. Uma grande perda!

Seguindo a nossa história, recordo das primeiras campanhas de Duda Mendonça para Paulo Maluf, em São Paulo. Amo SP, voto Maluf. Quem não se lembra deste mote? Foram várias campanhas de governadores e depois a belíssima campanha que elegeu Lula presidente pela primeira vez em 2002. Começava com a apresentação da equipe do candidato em um belo estúdio-escritório e terminava com as grávidas de branco no campo ao som do Bolero de Ravel. Destaco que Duda trabalhou junto com João Santana, que depois veio a seguir carreira solo, e sempre teve ao seu lado sua sócia, Zilmar Fernandes.

Em 2014, tive a oportunidade de derrotar a equipe liderada pelo Duda Mendonça, que cuidava da campanha de Delcídio Amaral (PT) e eleger Reinaldo Azambuja (PSDB) governador do Mato Grosso do Sul. Reinaldo inicia a campanha com 4% e Delcídio tinha mais de 65%das intenções de votos. Foi uma virada espetacular,baseada no conceito de “Mudança de Verdade”.

Chico Santa Rita comecei a acompanhar desde o plebiscitode 1993, do Parlamentarismo (comandada pelo Duda) versus o Presidencialismo (liderada pelo Chico). Foi uma virada histórica do presidencialismo com a tese de que o voto era um direito do povo, que estavam tentando tirar. Já em 2005, no Referendo das Armas, o “Sim” inicia a disputa com uma dianteira superior a 70%, com a grande mídia toda defendendo o desarmamento. Chico Santa Rita conduziu a campanha do “Não”.( Na época, comoconsultor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), através da TV Cultura de São Paulo, que produzia a Campanha Vota Brasil, fizemos uma pesquisa qualitativa nacional e liguei para o Chico. Argumentava com ele que mesmo que o “Sim” estivesse na frente, a pesquisa mostrava que as pessoas estavam com medo e não confiavam na polícia. Achavam que o desarmamento iria tirar as armas das pessoas de bem e não iria desarmar os bandidos. Que, na verdade, o desarmamento iria aumentar a insegurança e não diminuiria a violência. Só não tinham informação suficiente e estavam sendo levadas pela onda. As pesquisas quantitativas, também, mostravam que os estratos mais escolarizados do eleitorado, tradicionais preditores de voto, já indicavam uma tendência de mudança no cenário. Recordo que o Chico disse assim:

“- Rodrigo, estou sentindo um cheiro de reviravolta, igual ao que aconteceu no Plebiscito da Forma e do Sistema de Governo.”

E não deu outra.) A campanha muito bem conduzida por Santa Rita conseguiu fazer a informação chegar às pessoas e promoveu o que chamamos em marketing de “transfusão”.              Ou seja, a propaganda não inventou nada, apenas reforçou e canalizou a predisposição já presente nas massas. Lembro, como se fosse hoje, de um filme na TV em que aparecia um homem com um capuz no rosto. O locutor em off falava que, se o desarmamento fosse aprovado, a insegurança iria aumentar e o cidadão que precisa se proteger iria ficar indefeso. No filme, o ator (que representava um bandido) ia tirando a máscara e abrindo um sorriso.                 A propaganda dialogavaexatamente com o sentimento detectado na pesquisa. E, mais uma vez, Chico utilizava o mesmo argumento do plebiscito do presidencialismo, de que estavam tentando tirar direitos do povo, agora o de poder escolher ter ou não uma arma para se proteger.

Nestes últimos dias estava relendo os preciosos livros de Duda Mendonça – Casos & Coisas e, Batalhas Eleitorais e Novas Batalhas Eleitorais, de Chico Santa Rita. Sãoverdadeiras aulas de marketing político – os mestres relatam seus cases e trazem-nos diversos ensinamentos.

Neste artigo contei um pouco da minha trajetória para destacar o trabalho de alguns dos profissionais que construíram a história e engrandeceram o marketing político brasileiro. Tenho muito orgulho de ter estes grandes profissionais como meus mestres. Infelizmente a maior parte deles já não estão mais aqui neste plano.

Modestamente, tento seguir aplicando os ensinamentos apreendidos dos mestres no dia-a-dia das campanhas que coordeno e nas consultorias a governos e a lideranças políticas.                                      Salve Chico! Salve Duda!Salve Manhanelli.

 

Rodrigo Mendes* é estrategista e consultor de marketing e comunicação desde 1996. Sociólogo, especialista em marketing e inteligência de mercado e mestre em ciência política.