THALES DE MENEZES

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – De tempos em tempos, algum filme de violência e terror tem uma boa ideia no enredo e deixa o gênero levemente superior às caçadas sangrentas que costumam ditar as regras desse tipo de entretenimento. Em 2013, “Uma Noite de Crime” conseguiu ser essa boa exceção.

Não era uma produção de segunda categoria. Tinha no elenco Ethan Hawke, na época em ótima fase na carreira, até com indicação ao Oscar. E, por trás da câmera, estava o produtor Michael Bay, poderoso em Hollywood com vários blockbusters, entre eles a franquia “Transformers”.

Hawke interpretava um engenheiro que fez fortuna criando e fabricando alarmes sofisticados para residências. E o filme mostrava exatamente como esse tipo de produto tinha ficado tão necessário a todos.

“Uma Noite de Crime” mostrava um futuro não muito distante, no qual o governo americano havia adotado um método inovador para conter a violência. Durante 12 horas, em uma única noite por ano, todos os crimes eram liberados. A polícia parava de agir, e as pessoas podiam sair pelas ruas matando, roubando, quebrando coisas ou fazendo qualquer tipo de maldade com qualquer um que encontrasse.

Segundo a mente perturbada do roteirista, isso fazia com que durante o resto do ano as pessoas evitassem o estresse e não fossem seduzidas por seus desejos violentos. Ou seja, uma noite de crimes sem freio algum dava tranquilidade aos outros 364 dias do ano, e os índices de criminalidade praticamente zeravam.

“Uma Noite de Crime: A Fronteira” chega agora aos cinemas como o quinto longa da franquia, que deu origem também a uma série de TV sofrível. Quase sempre, sequências de filmes de terror têm qualidade decrescente a cada nova estreia. Aqui não é diferente, mas é preciso reconhecer no novo filhote um esforço para dar uma chacoalhada na mesmice das histórias.

Depois de anos de sucesso dessa terapia contra violência, uma nova noite se aproxima. A ação fica concentrada no Texas, perto da fronteira com o México. Os personagens principais formam um casal que, no início do filme, fazem aquele sofrido processo de atravessar o deserto para entrar clandestinamente nos Estados Unidos.

Quase um ano depois, eles têm seus empregos e enfrentam o preconceito dos americanos brancos, na véspera da noite dos crimes permitidos. Passando por algumas situações de tensão, eles conseguem ficar a salvo até o dia amanhecer. Aí retornam para sua rotina de trabalho na manhã seguinte, como todo mundo. Na verdade, como quase todo mundo.

Grupos armados por todo o país decidem continuar a onda de violência. E um inferno ganha as ruas, com toda a sorte de malucos violentos, de serial killers solitários a bandos organizados com tatuagem de suástica na face.

“Uma Noite de Crime: A Fronteira” é o chamado “escape movie”, aquele longa de ação em que sobreviver é a única motivação dos personagens. Uma boa parte no enredo lembra um game de tiro ao alvo, com sangue jorrando para todos os lados. Mas tiroteio e pancadaria são costurados de um modo ágil, com boas cenas de suspense.

A mistura da premissa aterrorizadora da franquia com as tensões raciais, que cresceram bastante durante o mandato de Donald Trump, foi uma ideia muito esperta. Aliás, a semelhança visual entre os malucos do filme e os seguidores de Trump que invadiram o Congresso americano em janeiro deste ano não pode ser tratada como coincidência.

No elenco, esse tipo de filme não costuma exibir muita qualidade, mas há o brilho individual de Ana de la Reguera, atriz de “Army of Dead: Invasão em Las Vegas” e da série “Narcos”, com Wagner Moura. Ela interpreta Adela, que conduz a fuga alucinada de um grupo.

A personagem tem um misterioso talento para manusear armas e traz empoderamento feminino a uma franquia que parece longe de acabar. Boa notícia para quem gosta de um filme de ação que permite desligar o cérebro por duas horas dentro do cinema.

UMA NOITE DE CRIME: A FRONTEIRA
Quando: Estreia na quinta (2)
Elenco: Ana de La Reguera, Tenoch Huerta, Josh Lucas, Will Patton
Produção: EUA, 2021
Direção: Everardo Valerio Gout
Avaliação: Bom